Contos de Grimm
Os Contos de Fadas dos Irmãos Grimm, originalmente compilados por Jacob e Wilhelm Grimm, são uma coleção de contos populares atemporais que encantam leitores há séculos. Estes contos são um verdadeiro tesouro de folclore, apresentando histórias de coragem, magia e moralidade que ressoam através das gerações. Desde clássicos como ”Cinderela”, ”Branca de Neve” e ”João e Maria”, até joias menos conhecidas como ”O Pescador e sua Mulher” e ”Rumpelstiltskin”, cada história oferece um vislumbre do rico tecido da tradição oral europeia. Os Contos de Fadas dos Grimm são caracterizados por seus personagens vívidos, lições morais e frequentemente tons sombrios, refletindo as duras realidades e os elementos fantásticos de seus contextos históricos. Seu apelo duradouro reside em sua capacidade de entreter, ensinar e inspirar maravilha, tornando-os um alicerce da literatura infantil e uma fonte de fascínio para estudiosos do folclore e da narrativa.
Episodes
Wednesday Aug 14, 2024
Wednesday Aug 14, 2024
Houve, uma vez, um rapaz, ainda imberbe, mas muito corajoso, chamado Miguel. Desde criança desejava ser soldado e, ao chegar à idade própria, alistou-se. Logo rebentou a guerra e ele portou-se com a maior bravura; era sempre o primeiro onde o perigo era maior. Quando acabou a guerra, o exército foi licenciado e Miguel despedido, recebendo pequena soma de dinheiro em paga pelos serviços prestados.Durante esse tempo, seus pais haviam morrido e Miguel não tinha mais um lar; então foi procurar os irmãos, pedindo-lhes que o deixassem ficar em sua companhia até que viesse nova guerra. Os irmãos, porém, muito maus de coração, disseram:- Que faremos contigo? Não entendes nada dos trabalhos do campo e não há lugar para ti; arranja-te como puderes.O pobre soldado nada mais tinha no mundo senão a espingarda; pôs a arma a tiracolo e, muito triste e desanimado, foi andando ao acaso, sem saber como ganhar o pão. Chegou a um grande descampado, onde só se viam algumas árvores formando um círculo; sentou-se à sombra delas e pôs-se a cismar na sua amarga sorte: "Não tenho dinheiro, não aprendi outra coisa senão lidar com armas e agora, estando concluída a paz, ninguém precisa de mim; se começo a mendigar, dirão que sou forte e é uma vergonha estender a mão. Vejo, pois, que tenho de morrer de fome...Nisto ouviu um forte ruído; olhando em redor, viu a dois passos um desconhecido trajando um casaco verde, com ares de fidalgo, mas um de seus pés era um monstruoso casco de cavalo. Plantou-se-lhe em frente e disse:- Sei o que te falta; terás dinheiro e riquezas para gastar à vontade mas, primeiro, quero saber se és corajoso para não gastar inutilmente o meu dinheiro.- Um soldado e medo são coisas impossíveis de combinar! - respondeu Miguel. - Podes pôr-me à prova.- Muito bem, - disse o desconhecido, - olha para atrás de ti.Miguel voltou-se e viu, a poucos passos, um enorme urso, que avançava rosnando para ele.- Oh, espera que vou coçar-te o nariz e fazer-te perder a vontade de rosnar.E, apontando a espingarda com a maior tranquilidade, deu um tiro certeiro no focinho do animal, fazendo-o cair fulminado.- Muito bem, - disse o desconhecido; - vejo que não te falta coragem; mas há ainda outra condição a preencher.- Contanto que não prejudique a salvação da minha alma, aceito-a, - disse Miguel, sabendo quem tinha na frente, - do contrário não contes comigo.- Tu mesmo o verás, - respondeu o desconhecido. - Durante os próximos sete anos, não te lavarás, nem te pentearás, não deves cortar os cabelos, as unhas nem a barba e, tampouco, deves dizer um único Padre-Nosso. Se morreres nesse intervalo, a tua alma será minha; se não morreres, então serás livre e rico pelo resto da tua vida.Miguel pensou na grande miséria em que se achava e como tinha enfrentado a morte tantas vezes; quis desafiá-la mais uma vez e concordou.O diabo, então, (porque era bem ele), despiu o casaco verde, entregou-o ao soldado, dizendo:- Com este casaco no corpo, sempre que puseres a mão no bolso tê-la-ás cheia de dinheiro.Em seguida, tirou a pele do urso e disse:- Esta pele será o teu capote, bem como a tua cama, pois nela e em nenhuma cama deverás dormir. Graças a esse capote, te chamarás Pele de Urso.Disse isso e desapareceu.Miguel vestiu logo o capote e meteu a mão no bolso, constantando que era verdadeiro o que dissera o diabo. Cobrindo-se com a pele de urso, pôs-se a caminho para correr mundo; foi um bom camarada e não desprezava nada que lhe pudesse proporcionar o dinheiro.No primeiro ano tudo correu mais ou menos bem, mas no segundo, foi uma calamidade; ele parecia um monstro. Os cabelos formavam uma carapinha nojenta, cobrindo-lhe parte do rosto; a barba muito comprida parecia um pedaço de feltro velho; as unhas transformaram-se em garras aduncas e o rosto estava de tal forma sujo que se poderia nele plantar agrião o qual certamente cresceria bem. As pessoas que encontrava fugiam dele espavoridas; contudo, dava muito dinheiro aos pobres para que rezassem por ele, pedindo a Deus que o não deixasse morrer antes dos sete anos; além disso, pagava regiamente e, nas hospedarias, encontrava sempre hospitalidade.No quarto ano daquela estranha vida, chegou certo dia, muito cansado, a uma hospedaria desconhecida. O hospedeiro recusou-se a recebê-lo. Miguel então pediu que o deixasse descansar na cocheira, mas o hospedeiro nem isso queria permitir, alegando que iria espantar os cavalos. Mas quando Miguel meteu a mão no bolso e tirou um punhado de moedas de ouro, o hospedeiro abrandou e deu-lhe um quartinho nos fundos da casa, fazendo-lhe prometer que não se mostraria para que a casa não perdesse o bom renome que gozava.A noite, sozinho no seu quartinho, Miguel, sentado, muito tristonho, desejava com todo o coração que esses sete anos tivessem fim, quando ouviu choros e gemidos no quarto próximo. Levado pelo seu coração compassivo, foi informar-se; abriu a porta e dou com um velho puxando os cabelos e chorando desesperadamente. Aproximou-se dele, mas o velho assustou-se e quis fugir. Finalmente, ouvindo uma voz humana e bondosa, deixou-se persuadir. Animando-o gentilmente, Miguel levou-o a contar a causa de seus sofrimentos. Revezes de fortuna tinham-lhe feito perder todos seus bens, ele e suas filhas padeciam fome, era tão pobre que nem sequer tinha com que pagar a pequena despesa na hospedaria e por isso seria certamente levado à prisão.- Se não tendes maiores aborrecimentos, - disse Miguel, - eu tenho dinheiro bastante para ajudar-vos.Mandou chamar o hospedeiro, pagou-lhe toda a conta e ainda deu ao velho uma bolsa cheia de moedas de ouro. Vendo-se livre de todos os apuros, o velho não sabia como demonstrar-lhe gratidão.- Vem comigo, - disse, - minhas filhas são maravilhosamente belas, poderás escolher uma delas para tua esposa. Teu aspecto é um tanto esquisito e pouco animador, mas, quando minhas filhas souberem o que fizeste por mim e por elas, nenhuma hesitará em casar contigo. Depois ela te porá em melhores condições.Miguel aceitou a proposta muito contente e acompanhou o velho até à sua morada. Quando entraram, a filha mais velha, ao ver Miguel de perto, deu um grito de espanto e fugiu a toda pressa.A segunda, mais corajosa, examinou-o dos pés à cabeça, depois disse:- Como é possível casar com um homem que nem figura humana tem? Prefiro casar-me com o urso rapado que passou por aqui uma vez e, fingindo que era um homem, usava um belo uniforme de hussardos e luvas brancas. Se fosse somente feio, ainda me habituaria com u sua fealdade, mas...A filha mais nova, entretanto, aproximou-se e disse:- Meu pai, ele deve ser um homem muito bom, desde que te socorreu na tua aflição; se em troca da sua generosidade lhe prometeste uma das tuas filhas, tens de manter a palavra dada.Infelizmente, o rosto de Miguel estava tão coberto de sujeira e de cabelos, que ninguém pôde perceber a alegre emoção que nele se refletia ao ouvir essas palavras. Tirou do dedo um anel de ouro, quebrou-o em duas partes iguais e deu uma à jovem, ficando com a outra; na metade que ficava com ela, inscreveu o seu nome, e na que ficava com ele, o nome dela, pedindo-lhe que guardasse bem essa metade do anel. Depois despediu-se, dizendo:- Sou obrigado a peregrinar ainda durante três anos se, então, passado ainda um mês, eu não aparecer, estás livre, porque morri. Mas pede a Deus que me conserve a vida para que sejamos felizes.A noiva vestiu-se de preto, declarando que não se vestiria de outra cor até que Miguel voltasse; quando pensava em Miguel, na repulsão que ele inspirava, vinham-lhe as lágrimas aos olhos. As irmãs não paravam de caçoar dela, zombando:- Toma cuidado, - dizia a mais velha, - se lhe dás a mão ele te baterá com a pata.- Fica atenta, - dizia a outra, - os ursos são doidos por doces; quando comeres doces, cede-lhe a tua parte, se não come-te.- Terás de fazer sempre a sua vontade, - tornava a primeira, - se não põe-se a rosnar.E a segunda replicava:- O casamento será divertido, sem dúvida; os ursos dançam admiravelmente.A noiva calava-se, não se deixando sugestionar e pedia com fervor a Deus que protegesse o noivo. Este continuou a sua vida errante, de um lugar para outro, fazendo por toda parte todo o bem possível, dando largamente esmolas aos pobres para que rezassem por ele.Quando finalmente chegou o dia em que completava os sete anos de cativeiro, voltou ao descampado e foi sentar-se sob as árvores em círculo. Não tardou muito, uma forte rajada de vento fez curvar as árvores até ao chão. O diabo estava na frente dele, fitando-o muito mal- humorado; atirou-lhe seu velho casaco, dizendo:- Vamos, anda logo, dá-me o meu casaco verde.- Devagar, devagar, - respondeu Miguel; - primeiro tens de pôr-me tal como eu era antes.De boa ou má vontade, o diabo teve de ir buscar água, lavá-lo, penteá-lo e aparar-lhe as unhas. Terminada a operação, Miguel apareceu muito mais bonito do que antes, tão garboso e imponente que até parecia um general.E seguida, o diabo retirou-se sempre furioso e Miguel sentiu o coração completamente aliviado. Dirigiu- se à cidade e mandou confeccionar uma vistosa roupa de veludo e rendas, de grande fidalgo; tomou uma carruagem atrelada com quatro soberbos cavalos brancos e foi à casinha da noiva. Ninguém o reconheceu; o velho, que o tomava por um oficial dos mais graduados, levou-o para a sala onde estavam as filhas.Foi convidado a sentar-te entre as duas mais velhas; estas serviam-lhe o melhor vinho e os melhores petiscos, achando que nunca haviam visto em toda a vida um homem tão belo quanto ele.A noiva, porém, sentada em frente dele, vestida de preto, não erguia os olhos e não abria a boca para dizer uma só palavra. Terminado o almoço Miguel perguntou ao velho se queria dar-lhe uma das filhas por esposa As duas mais velhas, ao ouvirem isso, correram para os quartos a se enfeitarem com os mais belos adornos, cada qual com a esperança de ser a preferida. Assim que ficou só com a noiva, Miguel pegou a metade do anel que guardara consigo e deixou-o cair dentro de um copo de vinho; apresentou depois o copo à noiva dizendo que queria beber à sua saúde. Ela aceitou o copo e bebeu; quando acabou viu brilhar qualquer coisa no fundo e logo reconheceu a metade do anel. Muito comovida e o coração a pulsar doidamente, tirou do peito a outra metade do anel que trazia suspensa numa fita; aproximou as duas metades e viu que se completavam perfeitamente.- Minha querida, - disse ele, - eu sou o noivo e tu o conheceste como o Pele de Urso; mas, por graça de Deus, recuperei a figura humana e estou inteiramente limpo daquela imundície que me recobria todo. Agora voltei para te desposar.Aproximou-se-lhe com grande ternura, estreitou-a nos braços e beijou-a. Nesse momento, entraram as duas irmãs, todas enfeitadas e trajando os vestidos mais ricos. Quando souberam que o belo e garboso Miguel, que tanto haviam desdenhado, ia casar-se com a irmã mais nova, sairam correndo, loucas de ruiva. A mais velha afogou-se no poço e a segunda enforcou-se numa velha figueira.A noite, ouviram bater na porta. Miguel foi abrir e deu com o diabo na sua casaca verde, que lhe disse:- Não fiz tão mau negócio. Perdi a tua alma mas, em compensação, ganhei duas.Este episódio é-lhe oferecido por Podbean.com.
Wednesday Aug 14, 2024
Wednesday Aug 14, 2024
Houve, uma vez, um pobre soldado aposentado que não possuía nada, nada; nem mesmo o que comer e não sabia como se arrumar.Certo dia, foi à floresta e, após ter perambulado um pouco por lá, encontrou um anão, o qual não era outro senão o próprio diabo, que lhe perguntou:- Que tens? Parece estar muito triste!- Sinto fome, - respondeu o soldado, - e não tenho um níquel sequer.- Se quiseres empregar-te em minha casa, - disse o diabo, - e ser meu criado, terás o necessário para o resto da vida. Terás de me servir durante sete anos; depois ficarás livre novamente. Mas presta bem atenção:não poderás lavar-te, nem aparar as unhas e os cabelos, e nem limpar o nariz oU enxugar os olhos.- Está bem, - disse o soldado; - já que não há outro jeito, aceito.E o anão conduziu-o ao inferno; depois explicou-lhe o que tinha a fazer; atiçar o fogo embaixo dos tachos onde se coziam as almas danadas, manter a casa bem limpa, varrer o lixo atrás da porta e procurar fazer com que tudo estivesse em ordem à sua chegada. Mas, se expiasse uma só vez dentro dos tachos, pagaria caro a curiosidade. O soldado concordou, dizendo:- Está bem, farei tudo direito.O velho satã deixou-o e tornou às suas peregrinações; o soldado então começou o trabalho: pós mais lenha no fogo, varreu a casa e levou o lixo atrás da porta, tudo como lhe fora ordenado. De regresso, o velho diabo inspecionou a casa, achando tudo em ordem: um bom fogo embaixo dos tachos e estes ferviam em grande ebulição; mostrou-se satisfeito e depois tornou a sair.Os tachos estavam colocados em círculo e ferviam bem no inferno, embaixo deles ardia um fogo louco e dentro borbulhavam os ingredientes. Ah, que prazer teria de espiar o que continham, se o diabo não lhe tivesse proibido tão severamente! Por fim, não resistiu mais, ergueu um pouquinho a tampa de um dos tachos e espiou. Então o soldado viu, dentro, um cabo que fora seu superior.- Ah, lindo pássaro, - disse o soldado, - encontro-te aqui! Antes era eu que estava nas tuas mãos, agora, és tu que estás nas minhas!Tapou, rapidamente, o tacho e alimentou mais o fogo; depois dirigiu-se ao seguinte, ergueu um pouquinho a tampo espiando dentro e viu o seu tenente.- Ah, belo pássaro, estás aqui? Eu estive muito tempo nas tuas mãos, agora tu estás nas minhas!Tapou depressa o tacho e pôs bastante lenha no fogo para avivá-lo bem. Depois quis espiar, também, no seguinte e espantou-se ao ver que lá dentro estava precisamente o seu general.- Ah, meu belo pássaro, também estás aqui? Antes estava eu nas tuas mãos; agora tenho-te em meu poder.Pegou no fole e assoprou com força no fogo até aumentar bem as chamas embaixo do caldeirão do general.Assim, prestou serviço no inferno durante sete anos, e nunca se lavou, nem penteou os cabelos, nem assoou o nariz, nem enxugou os olhos e nem aparou as unhas e cabelos. Os sete anos passaram tão depressa que não lhe pareceram mais que seis meses. Terminado o prazo convencionado, veio o diabo e perguntou:- Então, João, que fizeste?- Aticei o fogo sob os caldeirões, varri a casa e levei o lixo atrás da porta conforme me ordenaste.- E olhaste dentro dos tachos; a tua sorte foi ter acrescentado mais lenha ao fogo, senão a esta hora já estarias liquidado. Agora terminou o teu tempo de serviço aqui, queres regressar à tua casa?- Sim, - disse o soldado, - gostaria muito de ver o que anda fazendo meu pai.O diabo então disse:- Como tens direito a uma remuneração pelo teu trabalho, vai atrás da porta e enche a mochila com quanto lixo nela couber e leva-o para casa. Tens de ir sem te lavar nem pentear, com a barba, os cabelos e as unhas sem cortar e os olhos remelentos. Se alguém te perguntar de onde vens, responde que vens do inferno; quando te perguntarem quem és, deves dizer:- Sou o fuliginoso irmão do diabo e o rei de mim mesmo.O soldado ficou calado, fazendo tudo, exatamente, como lhe ordenou o diabo, mas não estava nada satisfeito com essa remuneração.Assim que se viu, novamente, na floresta, tirou a mochila das costas e quis despejá-la aí mesmo, mas, quando a abriu, o lixo tornara-se ouro puro.- Estava longe de supor isso! - disse João muito satisfeito, e encaminhou-se para a cidade.Chegou diante de uma estalagem e o dono dela, que estava na porta, ao avistá-lo, assustou-se tremendamente, porque João tinha um aspecto medonho, mil vezes pior que um espantalho. Assim mesmo perguntou-lhe:- De onde vens?- Do inferno.- Quem és?- Sou o fuliginoso irmão do diabo e o rei de mim mesmo.O estalajadeiro não queria deixá-lo entrar em casa, mas quando João lhe mostrou o ouro que trazia, correu a abrir-lhe pessoalmente a porta.João pediu o melhor quarto e a comida mais fina; comeu e bebeu até fartar-se, mas não se lavou, não se penteou, não fez nada do que lhe proibira o diabo e, por fim, deitou-se para dormir.Mas a tal mochila cheia de ouro não saía dos olhos do estalajadeiro e não ficou sossegado até que, esgueirando-se cuidadosamente no quarto, não a furtou.Na manhã seguinte, quando João se levantou e quis pagar a conta antes de continuar o caminho, a mochila tinha desaparecido. Mas dominou-se e pensou: "Não te cabe a culpa por esta infelicidade." E voltou imediatamente para o inferno, onde foi se queixar ao velho diabo, pedindo-lhe que o socorresse nessa desagradável emergência. O diabo disse:- Senta-te aí; vou lavar-te, pentear-te, assoar o na- ris; vou aparar-te as unhas e os cabelos e limpar os olhos.Quando acabou essa tarefa, deu-lhe outra mochila cheia de lixo, dizendo:- Agora vai dizer ao estalajadeiro que te restitua o ouro; senão irei pessoalmente buscá-lo e aí terá de assumir o teu lugar aqui para atiçar o fogo.O soldado subiu e foi ter com o estalajadeiro, dizendo-lhe:- Tu roubaste todo o meu ouro; se não o devolves já, irás para o inferno, ficarás trabalhando no meu lugar e ficarás medonho como eu.O estalajadeiro, amedrontado, restituiu-lhe o ouro, acrescentando mais algum do seu e suplicou-lhe que nada dissesse ao diabo.Assim João ficou imensamente rico. Pôs-se a caminho para a casa do pai; numa loja comprou uma túnica branca bastante ordinária, e meteu-se pela estrada tocando alegremente, pois havia aprendido música com o diabo no inferno.Aconteceu que nesse país havia um Rei e o soldado teve que tocar em sua presença; o Rei ficou tão encantado com a música que prometeu dar-lhe a filha mais velha em casamento. Ouvindo a princesa, que seria dada em casamento a um obscuro plebeu de túnica branca e ordinária, exclamou:- Prefiro antes atirar-me no poço.Então o Rei deu-lhe a filha mais moça a qual, para agradar o pai, aceitou de bom grado.Assim, o fuliginoso irmão do diabo casou-se com a linda princesa e, quando o velho Rei faleceu, ficou reinando sobre o reino todo.Este episódio é-lhe oferecido por Podbean.com.
Wednesday Aug 14, 2024
Wednesday Aug 14, 2024
Houve, uma vez, um pobre lenhador que trabalhava de sol a sol. Assim, conseguiu economizar um pouco de dinheiro e, chamando o filho, disse-lhe:- Tu és meu único filho; o dinheiro que economizei com o amargo suor do meu rosto, quero empregá-lo na tua instrução; se aprenderes tudo bem, poderás manter- me na velhice, quando meus membros estiverem endurecidos e eu for obrigado a ficar em casa sem nada poder fazer.O jovem foi para a universidade, onde permaneceu algum tempo, aprendendo com grande aplicação, merecendo a admiração e os elogios dos mestres; tinha seguido vários cursos mas ainda não se aperfeiçoara em tudo, quando a mísera soma ganha com tanto sacrifício pelo pai acabou-se e ele teve de voltar para casa.- Ah, - lastimou-se o pai, - não tenho mais nada que possa dar-te e, nestes tempos ruins como andam, nem posso ganhar um só centavo além do pão de cada dia,- Não te aborreças, meu querido pai, - respondeu o filho, - se esta é a vontade de Deus, certamente será para o meu bem e eu me conformarei.Quando o pai se preparava a ir à floresta cortar lenha para vender e assim ganhar alguma coisa, o filho disse-lhe:- Quero ir contigo e ajudar-te.- Será muito duro para ti, meu filho, que não estás acostumado com trabalho pesado; não aguentarás. Além disso, só possuo um machado e não tenho dinheiro para comprar outro.- Vai à casa do vizinho, - respondeu o filho, - e pede-lhe um machado emprestado até eu ganhar o suficiente para comprar outro para mim.O pai foi ao vizinho e pediu-lhe emprestado um machado; e assim, na manhã seguinte, logo de madrugada, saíram os dois a caminho da floresta. O filho, alegre e desembaraçado, ajudou bem o pai. Quando o sol estava a pique, disse o velho:- Sentemo-nos um pouco aí e comamos nosso lanche; depois continuaremos com mais vigor.O filho recebeu a ração de pão e disse:- Descansa um pouco, meu pai; eu não estou cansado e prefiro dar um passeio pela floresta à cata de ninhos.- Ó tolinho, - respondeu o pai, - para que queres perambular pela floresta? Ficarás cansado e, depois, não terás força para erguer o braço. Fica aqui e senta-te perto de mim.O filho, porém, não lhe deu ouvidos e encaminhou-se para a floresta, comendo alegremente o pedaço de pão e olhando por entre os galhos a ver se descobria algum ninho. Andando a esmo, foi longe e chegou ao pé de um carvalho enorme, assustador, que deveria ter muitos séculos de existência, pois o tronco não poderia ser abraçado por cinco homens. Deteve-se a contemplar a árvore, pensando: "Muitos pássaros, certamente, fizeram ninhos lá em cima." Nisso, prestando ouvido, pareceu-lhe ouvir uma voz abafada a gritar:- Solte-me daqui! Solte-me daqui!Olhou para todos os lados mas não viu coisa alguma, parecendo-lhe que a voz saía de dentro do chão. Então perguntou alto:- Ondes estás? Quem chama assim?A voz respondeu:- Estou aqui no chão, entre as raízes do carvalho. Ajuda-me a sair, ajuda-me a sair.O estudante pôs-se ativamente a revolver a terra debaixo da árvore, procurando entre as raízes, até que, por fim, numa pequena cavidade, descobriu uma garrafa. Erguendo-a e olhando-a contra a luz, ele distinguiu dentro dela uma coisinha em forma de rã, que pulava para cima e para baixo.- Solta-me daqui, solta-me daqui! - gritou novamente; e o estudante, sem pensar em maldade alguma, destapou a garrafa.No mesmo instante, saiu de dentro dela um espírito, que começou a crescer, e cresceu tão rapidamente que, em poucos minutos apenas, ergueu-se diante do estudante como um horrendo gigante do tamanho da metade do carvalho.- Sabes tu o que te aguarda por me haveres salvo? - gritou com voz terrificante.- Não, - respondeu o estudante, sem sombra de medo; - como haveria de sabê-lo?- Pois, então, digo-te já, - berrou o espírito; - tenho que torcer-te o pescoço.- Devias ter-me dito isso antes, - respondeu o estudante; - eu teria deixado que ficasses lá dentro. Mas a minha cabeça ficará firme no pescoço, pois há alguém mais que deve dar parecer no caso.- Qual alguém ou ninguém, - rugiu o espírito; - terás o que mereces. Achas que foi por misericórdia que fiquei preso tanto tempo? Não; foi por castigo. Eu sou o poderosíssimo Mercúrio; a quem me soltar tenho de lhe quebrar o pescoço.- Devagar, devagar! - respondeu o estudante; - não tenhas tanta pressa! Antes de mais nada, preciso saber se realmente estavas naquela garrafa e se és na verdade um espírito; se conseguires entrar e sair novamente, acreditarei; então poderás fazer de mim o que quiseres.- E a coisa mais fácil deste mundo, - disse o espírito, cheio de vaidade e orgulho.Encolhendo-se mais e mais, tornou-se fininho e pequenino como fora antes, conseguindo passar facilmente pelo gargalo da garrafa. Mal entrou, o estudante tapou bem depressa a garrafa com a rolha e atirou-a outra vez para dentro do buraco, entre as raízes do carvalho. Assim o espírito saiu logrado.O estudante dispuha-se a voltar para junto do pai, quando ouviu o espírito implorar lamentosamente:- Solta-me daqui, solta-me daqui!- Nada, nada, - respondeu o estudante; - nessa não cairei segunda vez. Quem atentou uma vez contra a minha vida, quando o agarrar não o soltarei nunca mais.- Se me soltares, - disse o espírito; - eu te darei o suficiente para que vivas folgadamente pelo resto da vida.- Não, não - respondeu o estudante; - vais enganar-me como da primeira vez.- Estás dando um pontapé na sorte! - retrucou o espírito; - não te farei mal algum, e, ainda por cima eu te recompensarei regiamente.O estudante refletiu: "Vou arriscar talvez cumpra a palavra e não me faça mal." Destapou, novamente, a garrafa e o espírito saiu como da outra vez e se foi encompridando e aumentando até voltar a ser o enorme gigante.- Agora receberás a recompensa - disse o espírito, dando ao estudante um trapo largo como um emplastro, dizendo: - se tocas com uma das pontas deste trapo qualquer ferida, ela sarará imediatamente; se com a outra ponta tocares ferro ou aço, logo esse objeto se converterá em prata.- Está bem, - disse o estudante, - mas antes tenho de experimentar.E, aproximando-se de uma árvore, fez uma incisão na casca com o machado, depois aplicou em cima o trapo para ver o resultado. Imediatamente a casca se uniu e sarou, ficando tal como estava antes.- É! - disse o estudante; - realmente é como dizes. Agora podemos separar-nos.O espírito agradeceu por ter-lhe dado a liberdade e o estudante também agradeceu pelo seu presente e voltou para junto do pai.- Estiveste vagabundeando até agora, não é? - disse o pai. - Até esqueceste o trabalho! Eu bem sabia que não farias coisa alguma!- Não te amofines, meu pai; vou recuperar o tempo perdido.- Sim, sim; - disse, agastado, o pai, - quero só ver!- Cuidado, meu pai; vou derrubar aquela árvore aí, que ficará em pedaços.Pegando no trapo, esfregou com ele o machado e, em seguida, desferiu valente machadada no tronco; mas como o machado se havia transformado em prata, o gume dobrou-se.- Oh, meu pai, vê que espécie de machado me deste; entortou completamente ao primeiro golpe!Assustado com aquilo, pois o machado não era seu, o pai exclamou;- Ah, meu filho, que fizeste! Agora tenho de pagar o machado e não sei como hei de fazê-lo; grande lucro me deu o teu trabalho!- Não te zangues, meu pai. Eu pagarei logo o machado.- Sim, seu toleirão, - falou o pai, - com que vais pagá-lo se não tens senão o que eu te dou? Pura fantasia de estudante tens na cabeça; quanto a rachar lenha, nada entendes!Passados alguns instantes, o estudante disse ao pai:- Meu pai, eu não posso mais trabalhar; vamos fazer feriado por hoje.- O que estás dizendo? Achas que quero ficar de mão no bolso como você? Se quiseres, podes voltar para casa, mas eu continuarei aqui trabalhando.- É a primeira vez que venho a floresta e não conheço ainda o caminho; não posso voltar sozinho. Vem comigo?Tendo-lhe passado a raiva, o pai deixou-se persuadir pela maneira gentil do filho e acabou por voltar com ele para casa. Aí disse-lhe:- Trata de vender o machado estragado e vê o que podes alcançar por ele; o que faltar terei que ganhar com o trabalho para compensar o nosso vizinho pelo dano sofrido.O filho dirigiu-se então à cidade, levando o machado a um ourives que, depois de o medir e pesar cuidadosamente, disse:- Vale quatrocentas moedas, mas não tenho tanto dinheiro.- Não faz mal, - disse o estudante, - dai-me o que tiverdes. Confio na vossa honestidade para me pagardes o resto depois.O ourives deu-lhe trezentas moedas, ficando a dever-lhe cem. O estudante voltou para casa e disse ao pai:- Já tenho o dinheiro; vai perguntar ao vizinho quanto quer pelo machado.- Eu já sei - respondeu o pai. - Uma moeda e meia.- Dá-lhe, então, três moedas; é o dobro do que vale e acho que é mais do que suficiente. Olha quanto dinheiro tenho!Entregou ao pai as trezentas moedas, dizendo:- Não te faltará mais nada e poderás viver confortavelmente.- Santo Deus! - exclamou o pai admirado, - onde arranjaste todo esse dinheiro?O filho, então, contou o que lhe tinha acontecido e como acertara confiando na Providência Divina.Com o resto do dinheiro, voltou para a Universidade e continuou a estudar, aprendendo tudo quanto havia para aprender. Mais tarde, como podia curar todas as feridas com o pedaço de trapo, tornou-se o médico mais afamado do mundo inteiro.Este episódio é-lhe oferecido por Podbean.com.
Wednesday Aug 14, 2024
Wednesday Aug 14, 2024
Houve, uma vez, um campónio chamado Camarão. Certo dia. Camarão levou um carro puxado por uma junta de bois, cheio de lenha, à cidade, e vendeu-a a um doutor. Enquanto recebia o dinheiro, Camarão viu que o doutor estava sentado à mesa comendo e bebendo tão bem que, de todo o coração, desejou ser doutor também. Quedou-se uns instantes a olhar e, depois, perguntou se não lhe seria possível tornar-se doutor.- Oh, é muito fácil! - disse o doutor.- Que devo fazer? - perguntou o camponês.- Em primeiro lugar, compra um abecedário, isto é, um livro que tem um galo no frontispício; em segundo lugar, vende o carro e bois convertendo tudo em dinheiro; em terceiro lugar, manda pintar uma tabuleta com os seguintes dizeres: "Eu sou o doutor Sabetudo," e manda pregá-la no alto da tua porta.O camponês executou tudo direitinho. Após ter "doutorado" um pouco, mas não muito, deu-se um furto de dinheiro na casa de um ricaço. Este ouviu falar no doutor Sabetudo, que morava em certa aldeia e que, de acordo com o próprio nome, deveria saber também que fim levara o dinheiro. Sem mais demora, o ricaço mandou atrelar o carro, seguiu para a tal aldeia, informando-se se era ele o doutor Sabetudo.- Sim, sou eu.Nesse caso, tinha de acompanhá-lo a fim de encontrar o dinheiro roubado.Sim, mas a Guida, sua mulher, também tinha que ir junto. O ricaço consentiu, fê-los subir no carro e partiram todos juntos. Quando chegaram ao solar, a mesa estava posta; então o ricaço convidou o doutor Sabetudo para jantar com ele. Sim, disse ele, mas também a Guida, sua mulher; e com ela foi sentar-se à mesa.Ao aparecer o primeiro criado, trazendo uma linda bandeja cheia de quitutes, o camponês deu uma cotovelada na mulher dizendo:- Guida, esse é o. primeiro; - referia-se ao primeiro prato.Mas o criado julgou que ele dizia: este é o primeiro ladrão e, como de fato o era, assustou-se muito e lá fora disse aos seus colegas:- O doutor sabe tudo, vamos acabar mal; ele disse que eu era o primeiro.O companheiro não queria entrar na sala, mas não lhe foi possível eximir-se; ao apresentar-se com o prato nas mãos, o camponês deu outra cotovelada na mulher dizendo:- Guida, esse é o segundo.O criado começou a tremer de medo e tratou de sair logo. O mesmo aconteceu com o terceiro criado. O quarto criado teve de trazer uma terrina coberta; nisso o ricaço disse ao doutor que desse uma prova de sua arte adivinhando o que ela continha; eram camarões. O camponês olhou para a terrina muito atrapalhado, e não sabendo como sair daquela entalada, exclamou:- Ah, pobre Camarão!Ouvindo isso, o ricaço disse:- Veja só, ele acertou. Então deve saber também onde está o dinheiro.O criado, que se estava pelando de medo, fez sinal imperceptível ao camponês para que fosse lá fora um instante. Uma vez lá fora, os criados confessaram que os quatro juntos haviam roubado o dinheiro. Estavam dispostos a restituí-lo e dar-lhe uma grande quantia se ele os não denunciasse; caso contrário, lhe cortariam o pescoço.Levaram-no até onde estava escondido o dinheiro; depois de concordar com tudo, o doutor voltou para a mesa, dizendo:- Senhor, quero agora ver no meu livro onde está o dinheiro.Mas o quinto criado acocorou-se num canto da lareira a fim de ouvir se o doutor sabia mais alguma coisa. O doutor abriu o abecedário, folheou-o um pouco, procurando o galo. E não o encontrando logo, disse:- Sei que estás aqui dentro, tens de sair para fora! O criado escondido na lareira julgou que se referisse a ele; cheio de susto pulou para fora dizendo:- Ah, esse homem sabe tudo.O doutor Sabetudo indicou ao ricaço o lugar onde se achava o dinheiro, sem dizer, porém, quem o havia roubado; então recebeu de ambas as partes uma grande recompensa e desse dia em diante, tornou-se famoso.Este episódio é-lhe oferecido por Podbean.com.
Wednesday Aug 14, 2024
Wednesday Aug 14, 2024
Houve, uma vez, um rei muito poderoso, que vivia feliz e tranquilo em seu reino. Um belo dia, adoeceu gravemente e ninguém tinha esperanças de que escapasse. Ele tinha três filhos, os quais estavam deveras consternados vendo que o estado do pai piorava dia a dia.Encontravam-se eles no jardim do castelo a chorar e, de repente, viram surgir à sua frente um velho de aspecto venerável, que indagou a causa de tamanha tristeza. Disseram-lhe que estavam aflitos porque o pai estava gravemente enfermo e os médicos já não tinham esperanças de o salvar.O velho, então, disse-lhe:- Eu conheço um remédio muito eficaz, que poderá curá-lo; é a famosa Agua da Vida. Mas é muito difícil obtê-la.O filho mais velho disse:- Hei de encontrá-la, custe o que custar.Dirigiu-se, imediatamente, aos aposentos do rei, expôs-lhe o caso e pediu permissão para ir em busca dessa água, a única coisa que poderia salvá-lo.- Não, - disse o rei; - sei bem que essa água maravilhosa existe, mas há tantos perigos a vencer antes de chegar à fonte, que prefiro morrer a ver um filho meu correndo esses riscos.O príncipe, porém, insistiu tanto que o pai acabou por consentir. Em seu íntimo, o príncipe ia pensando: "Se conseguir a água, tornar-me-ei o filho predileto e assim herdarei o trono."Partiu, pois, montado em rápido corcel, na direção indicada pelo velho. Após alguns dias de viagem, ao atravessar uma floresta, viu um anão mal vestido, que o chamou, perguntando:- Aonde vais com tanta pressa?- Que tens tu com isso, homúnculo ridículo? - respondeu altivamente o príncipe sem deter o cavalo, - não é da tua conta.O anãozinho enfureceu-se e rogou-lhe uma praga. Pouco mais adiante, o príncipe viu-se entalado entre duas barrancas; quanto mais andava, mais se estreitava o caminho, até que, tendo-se o atalho apertado demais, não pode mais avançar, nem recuar, nem voltar o cavalo, nem descer. Ficou ali aprisionado, sofrendo fome e sede, mas sem morrer.O rei aguardou sua volta durante muitos dias, mas em vão. O segundo filho, julgando que o irmão tivesse morrido, ficou contentíssimo, pois assim seria ele o herdeiro do trono.Foi ter com o pai e pediu-lhe permissão para ir em busca da Agua da Vida. O rei respondeu o mesmo que havia respondido ao primeiro; por fim, ante a insistência do rapaz, acabou cedendo. O segundo príncipe, então, montou a cavalo e seguiu pelo mesmo caminho. Após alguns dias, quando atravessava a floresta, surgiu-lhe o anão mal vestido, que lhe dirigiu a mesma pergunta:- Para onde vais com tanta pressa?- Oh, nojento pedaço de gente! Sai da minha frente se não queres que te espezinhe com o meu cavalo.O anão afastou-se e rogou-lhe a mesma praga que ao primeiro; assim, o príncipe acabou entalado nas barrancas como o outro irmão, sem poder avançar, recuar ou fazer qualquer movimento, sendo assim castigados os dois orgulhosos.Passados muitos dias e vendo que os irmãos não voltavam, o filho mais moço foi pedir licença ao pai para ir buscar a Água da Vida. O rei não queria consentir, mas, ante as insistências reiteradas do moço, foi obrigado a ceder. O jovem príncipe montou em seu belo cavalo e partiu; quando encontrou o anão na floresta, que lhe perguntou aonde ia com tanta pressa, o jovem, que era delicado e amável, deteve o cavalo dizendo:- Vou em busca da Agua da Vida, o único remédio que pode salvar meu pobre pai, que está à morte.- Sabes onde se encontra? - perguntou o anão.- Não, - respondeu o príncipe.- Pois bem; já que me respondeste com tanta amabilidade, - disse o anão, - vou indicar-te o caminho que deves tomar. Ao sair da floresta não te metas pelo desfiladeiro que vires pela frente; vira à esquerda e segue até encontrares uma encruzilhada; aí segue ainda a esquerda. Depois de dois dias de marcha, encontrarás diante de ti um castelo encantado: é no pátio desse castelo que se acha a fonte da Agua da Vida. O castelo está fechado por um grande portão de ferro maciço; mas basta tocá-lo três vezes com esta varinha que te dou para que se abra de par em par. Assim que entrares verás dois leões enormes prestes a lançarem-se sobre ti para te devorar; atira-lhes estes dois bolos para apaziguá-los; aí corre ao parque do castelo e vai buscar a Água da Vida antes que soem as doze badaladas, senão o portão fecha-se e tu ficarás lá preso.O príncipe agradeceu, gentilmente, ao anão, pegou a varinha e os dois bolos e se pôs a caminho; e conforme as suas indicações chegou diante do castelo. Com a varinha mágica bateu três vezes no imenso portão e este abriu- se; ao entrar, os dois leões arremessaram-se contra ele de bocas escancaradas, mas apaziguou-os, atirando-lhes os bolos, e assim não sofreu mal algum. Antes de dirigir-se à fonte da Água da Vida, o príncipe não resistiu à tentação de ver o que havia no interior do castelo cujas portas estavam abertas; galgou a escadaria e entrou. Viu uma série de salões grandes e luxuosíssimos; no primeiro deles viu, imersos em sono letárgico, uma multidão de fidalgos e criados. Sobre uma mesa avistou uma espada e um saquinho de trigo; teve um pressentimento que esses objetos lhe poderiam ser úteis e levou-os consigo.Passando de um salão para outro, no último deu com uma princesa de beleza deslumbrante, a qual se levantou e disse-lhe que, tendo conseguido penetrar no castelo, destruira o encanto que pesava sobre ela e todos os súditos do seu reino; mas o efeito do encantamento só cessaria mais tarde.- Dentro de um ano, dia por dia, - disse ela, - se voltares aqui serás meu esposo.Depois indicou-lhe onde estava a fonte da Água da Vida e despediu-se dele, recomendando-lhe que se apressasse para poder sair do castelo antes de o relógio da torre bater as doze badaladas do meio-dia, porque nesse momento exato os portões se fechariam.O príncipe percorreu em sentido inverso os numerosos salões por onde passara, até que um deles viu uma belíssima cama com as roupas muito alvas e rescendentes; como estivesse cansadíssimo da longa caminhada, sentiu-se tentado a descansar um pouco, deitou-se para tomar um breve repouso e adormeceu. Felizmente mexeu- se e fez cair no chão a espada que colocara ao seu lado; o barulho despertou-o em tempo, pois perdendo a hora ficaria prisioneiro no castelo.Levantou-se depressa; faltava apenas um minuto para o meio-dia e mal teve tempo de correr ao parque, encher um frasco com a preciosa água e fugir.Transpondo os batentes da entrada, soou o relógio dando meio-dia; o portão fechou-se com estrondo e tão rapidamente que ainda apanhou um tacão do príncipe arrancando-lhe uma espora.O príncipe estava no auge da felicidade por ter conseguido a água milagrosa que salvaria a vida do seu amado pai; e ansioso de ver-se no palácio pulou sobre a sela e partiu a galope. Na floresta, encontrou o anão no mesmo lugar, o qual, ao ver a espada e o saquinho de trigo, lhe disse:- Fizeste bem em guardar esse precioso tesouro! Com essa espada poderás sozinho vencer os exércitos mais numerosos; e com o trigo desse saquinho terás todo o pão que quiseres e nunca se lhe verá o fundo.Encantado por conhecer os dons prodigiosos da espada e do saquinho, estava contudo apoquentado com a ideia da desgraça dos irmãos; perguntou ao anão se não poderia fazer algo por eles.- Posso, - respondeu o anão; - ambos estão pouco distantes daqui, entalados entre barrancas muito apertadas; amaldiçoei-os por causa do seu orgulho e insolência.O príncipe rogou, encarecidamente, que lhes perdoasse e os libertasse, e tanto insistiu que o anão cedeu às suas súplicas.- Mas advirto-te que te arrependerás, - disse o anão. - Não te fies neles; são de mau coração; liberto-os apenas para te ser agradável.Assim dizendo, o anão fez as barrancas se afastarem deixando os entalados em liberdade; pouco depois reuniram-se ao irmão, que os estava esperando. Muito feliz por os tornar a ver, o príncipe logo lhes narrou as suas aventuras e disse-lhes que daí a um ano voltaria novamente ao castelo para desposar a maravilhosa princesa e reinar com ela sobre um grande país.Depois puseram-se os três a caminho de regresso para casa. Atravessaram um reino que estava assolado pela fome e pela guerra, estando o rei já desesperado de poder salvar-se e ao seu povo. O bom príncipe então confiou ao rei o saco de trigo e a espada mágica; com esses objetos, o rei conseguiu derrotar os exércitos invasores e encher todos os celeiros, até ao forro, do precioso cereal. O príncipe tornou a receber a espada e o saquinho e os três irmãos continuaram na viagem; para encurtar caminho e rever mais depressa o pai, resolveram tomar um navio.Durante a travessia, os dois irmãos mais velhos, devorados de ciúmes, começaram a conspirar contra ele:- Nosso irmão conseguiu a Água da Vida e nós não; com isso nosso pai o promoverá a herdeiro único do trono, que deveria ser nosso, e a nós nada tocará.Então juraram perdê-lo. De noite, quando ele dormia a sono solto, furtaram-lhe o frasco e substituíram a Água da Vida por outra salgada. Tentaram também roubar-lhe a espada e o saquinho de trigo mas, quando iam apoderar-se deles, os objetos desapareceram de repente.Quando chegaram em casa, o jovem correu para o pai e apresentou-lhe o frasco para que bebesse e logo ficasse bom. O rei, mal engoliu alguns goles daquela água salgada, achou o gosto horrível e piorou sensivelmente. Estava ele se lastimando quando chegaram os dois filhos mais velhos e acusaram o irmão de ter querido envenenar o pai. Eles, porém, traziam-lhe a verdadeira Agua da Vida e lha ofereceram. Apenas bebeu alguns goles, pôde logo levantar-se do leito, cheio de vida e de saúde, como nos tempos de sua juventude. O pobre príncipe, expulso da presença do pai, entregou-se ao maior pesar. Os dois mais velhos vieram ter com ele e, rindo e mofando, disseram-lhe:- Pobre tolo! Tu tiveste todo o trabalho e conseguiste encontrar a Agua da Vida, mas nós tivemos o proveito; devias ser mais esperto e manter os olhos abertos; enquanto dormi as a bordo, trocamos o frasco por outro de água salgada. E poderíamos, se, quiséssemos, ter-te atirado ao mar para nos livrarmos de ti, mas tivemos dó. Livra-te, contudo, de reclamar e contar a verdade ao nosso pai, que não te acreditaria; se disseres uma só palavra não nos escapas, perderás a vida. Também não penses em ir desposar a princesa daqui a um ano; ela pertencerá a um de nós dois.O rei estava muito zangado com o filho mais moço, julgando que o tivesse querido envenenar. Convocou, portanto, os seus ministros, e conselheiros e submeteu- lhes o caso. Foram todos de opinião que o príncipe merecera a morte e o rei decidiu que fosse morto secretamente por um tiro. E partindo o moço para a caça sem suspeitar de nada, um dos criados do rei foi encarregado de o acompanhar e matá-lo na floresta. Quando chegaram ao lugar destinado, o criado, que era o primeiro caçador do rei, estava com um ar tão triste que o príncipe indagou a razão daquilo:- Que tens, caro caçador?- Proibiram-me falar, mas devo dizer tudo, - respondeu o caçador,- Dize então o que há; nada temas.- Estou aqui por ordem do rei e devo matar-vos.O príncipe sobressaltou-se, mas disse;- Meu amigo, deixa-me viver; dar-te-ei meus belos trajes em recompensa e tu me darás os teus, que são mais pobres.- Da melhor boa vontade, - disse o caçador.- Ê preciso que o rei julgue que executaste as suas ordens, - disse o príncipe, - senão a sua cólera recairá sobre ti. Vestirei essas roupas feias e tu levarás as minhas como prova de que me mataste. Em seguida, abandonarei para sempre este reino.Assim fizeram.Pouco tempo depois, o rei viu chegar uma embaixada faustosa do rei vizinho, incumbida de entregar ao bom príncipe os mais ricos presentes em agradecimento por ter ele salvo o reino da fome e da invasão do inimigo. Diante disso, o rei pôs-se a refletir:- Meu filho seria inocente? - e comunicou aos que o serviam:- Como me arrependo de o ter mandado matar! Ah, se ainda estivesse vivo!Então, encorajado por essas palavras, o caçador revelou a verdade. Disse ao rei que o bom príncipe estava com vida, mas em lugar ignorado. Imediatamente o rei mandou um arauto proclamar em todo o pais que considerava o filho inocente e que desejava, imensamente, que ele voltasse para casa. Mas a notícia não chegou ao príncipe. Encontrara seu amigo anão, que lhe dera ouro suficiente para poder viver como um filho de rei.Nesse ínterim, a princesa do castelo encantado, que ele livrara do sortilégio, mandara construir uma avenida toda calcetada com chapas de ouro maciço e pedras preciosas, a qual conduzia diretamente ao castelo, explicando aos seus vassalos:- O filho do rei que será meu esposo não tardará a chegar; virá a galope bem pelo meio da avenida. Mas se outros pretendentes vierem, cavalgando à beira da estrada, expulsem-nos a chicotadas.Com efeito, dia por dia, um ano depois do jovem príncipe ter penetrado no castelo, o irmão mais velho achou que podia apresentar-se como sendo o salvador e receber a princesa por esposa. Ao atravessar o portão e vendo aquela avenida calçada no meio de ouro e pedrarias, não quis que o cavalo estragasse com as patas tanta riqueza, que ele já considerava suas, e fez passar o animal pelo lado de fora. Mas, quando chegou diante do portão do castelo, dizendo que era o noivo da princesa, todos riram e depois correram-no de lá a chicote.Pouco tempo depois, vinha também o segundo príncipe e, quando chegou à entrada do castelo, vendo todo aquele ouro e joias, pensou que seria um pecado arruiná-los. Deixou, portanto, o cavalo galopar pelo lado esquerdo e apresentou-se como sendo o noivo da princesa: teve a mesma sorte que o irmão mais velho: foi corrido a chicote.Estava justamente findando o ano estabelecido e o terceiro príncipe resolveu deixar a floresta para ir ter com sua amada e ao seu lado esquecer suas mágoas.Pôs-se a caminho, só pensando na felicidade de tornar a ver a linda princesa; ia tão embebido que nem se quer viu que a estrada estava toda coberta de pedras preciosas. Deixou o cavalo galopar pelo meio da avenida e, quando chegou diante do portão do castelo, este foi-lhe aberto de par em par. Soaram alegres fanfarras e uma multidão de fidalgos saiu para recebê-lo. Dentro em pouco, apareceu a princesa, deslumbrante de beleza, que o acolheu cheia de felicidade, declarando a todos que ele era seu salvador e senhor daquele reino. E as núpcias foram imediatamente realizadas em meio a esplêndidas festas.Depois de terminadas as festas, que duraram muitos dias, ela contou-lhe que seu pai o havia proclamado inocente e desejava vê-lo de novo.Acompanhado da rainha, sua esposa, ele foi ter com o pai e contou-lhe tudo quanto se passara: como fora traído pelos irmãos e como estes o obrigaram a calar-se.O rei, extremamente irritado contra eles, mandou que seus arqueiros os trouxessem à sua presença a fim de receberem o castigo merecido; mas, vendo suas maldades descobertas, eles tinham tomado um barco tentando fugir para terras longínquas para aí esconderem sua vergonha. Não o conseguiram. Sobreveio uma tremenda tempestade, que tragou o navio, e eles pereceram miseravelmente.Este episódio é-lhe oferecido por Podbean.com.
Wednesday Aug 14, 2024
Wednesday Aug 14, 2024
Ha mais de mil anos, existiam em nosso país muitos reizinhos de pequenos reinos, e um deles habitava no Monte Agudo. Esse rei gostava muito de caçar e, certa vez, ao sair do castelo com os caçadores, viu ao pé da montanha três moças fazendo pastar algumas vacas; ao verem o rei com a luzida corte, a mais velha disse às outras duas, apontando para o rei;- Olá! olá, se não casar com aquele lá, não casarei com mais ninguém!A segunda moça respondeu, indicando o que vinha à direita do rei:- Olá, olá, se não casar com aquele, não casarei com mais ninguém!Então a terceira moça apontou para o que vinha à esquerda do rei e disse:- Olá, olá, se não casar com aquele, não casarei com mais ninguém!Os dois que ladeavam o rei eram seus ministros.O rei ouviu tudo o que as moças disseram; ao voltar da caça, mandou chamar as três e perguntou-lhes o que haviam dito no dia anterior quando estavam ao pé da montanha. Naturalmente, elas não queriam repeti-lo; então o rei perguntou à primeira se queria casar-se com ele. Ela respondeu, prontamente, que sim e também suas irmãs casaram com os dois ministros, pois eram todas belíssimas, principalmente a rainha, que possuia cabelos tão loiros como o linho.Entretanto, as duas irmãs mais moças não tiveram filhos. Tendo que viajar, o rei mandou que ambas ficassem fazendo companhia à rainha, que esperava um filho, enquanto ele estivesse fora.Pouco depois, a rainha deu à luz um belo menino, que nasceu com uma estrela vermelha na testa. Invejando a sorte da rainha, as duas irmãs combinaram entre si lançar o menino no rio (creio que era o rio Weser), e nisso um passarinho alçou voo e cantou:
- Pronto para a morte,Oh, triste sorte.Vai entre os lírios em paz,meu belo rapaz!
Ouvindo aquilo, as duas irmãs se espantaram e fugiram. Assim que o rei voltou, elas contaram-lhe que a rainha tivera um cãozinho em vez de um menino. O rei disse serenamente:- O que Deus faz, está bem feito.Mas, à margem do rio, habitava um pescador, que retirou da água o menino ainda vivo e, como sua mulher não tinha filhos, resolveram criá-lo.Transcorrido um ano, o rei teve que fazer outra viagem e nesse ínterim a rainha deu à luz outro menino; as pérfidas irmãs apoderaram-se dele também e o jogaram no rio. Nisso, outro passarinho alçou voo e cantou:
- Pronto para a morte.Oh, que triste sorte.Vai entre os lírios em paz,meu belo rapaz!
E ao regresso do rei, apressaram-se a contar-lhe que a rainha dera à luz um gato. O rei, então, respondeu:- O que Deus faz, está bem feito.O pescador recolheu, também, esse menininho e criou-o junto com o outro.O rei teve de fazer nova viagem e desta vez a rainha deu à luz uma linda menina que, graças às duas irmãs da rainha, teve o mesmo destino dos meninos. Mas um passarinho voou nesse instante, cantando:
- Pronta para a morte.Oh, que triste sina;Vai para o berço de rosas,ó minha linda menina!
E, quando o rei voltou de sua viagem, as cunhadas disseram-lhe que a rainha dera à luz uma gata. Então ele enfureceu-se e mandou jogar a rainha numa masmorra, onde ficou muitos anos.Enquanto isso, as crianças foram crescendo belas e fortes; certo dia, o mais velho quis ir pescar junto com outros meninos, mas estes não quiseram e responderam- lhe:- Segue teu caminho; não queremos um enjeitado em nossa companhia.Profundamente chocado, o menino foi ter com o pescador e perguntou-lhe se era verdade o que ouvira daqueles maus meninos. O pescador contou-lhe, então, como o havia retirado da água. Ante essa revelação, o menino disse que queria procurar seu verdadeiro pai; o pescador tentou dissuadi-lo, pedindo-lhe que ficasse com eles, mas o menino não o atendeu e foi-se embora.Andou, andou dias e dias, até que, por fim, chegou à margem de um grande rio, onde avistou uma velha pescando.- Bom dia, avozinha! - disse o rapaz.- Muito obrigada! - respondeu ela.- Parece-me que levarás muito tempo até pescar um peixe!- E tu terás de procurar muito antes de encontrar teu pai! Como farás para atravessar este rio? - disse a velha.- Ah, só Deus é quem sabe!Então a velha pegou-o nas costas e baldeou-o para a outra margem e o rapaz continuou a procurar seu pai durante muito tempo ainda.Decorrido um ano. o segundo menino também partiu em busca do irmão; chegou à margem do rio e sucedeu-lhe tudo como ao irmão. Em casa, portanto, ficara somente a menina, a qual, não se conformando com a ausência dos irmãos, resolveu, depois de um ano de espera ir à procura deles. Chegando à margem do rio, avistou a velha e disse-lhe:- Bom dia, avozinha!- Muito obrigada!- Deus vos ajude a pescar bastante!Ouvindo essas palavras gentis, a velha tornou-se toda amabilidade e atravessou a menina para a outra margem do rio; aí, deu-lhe uma varinha, dizendo-lhe:- Segue sempre por este caminho, minha filha, e, ao passares perto de um enorme cão preto, continua andando silenciosamente, sem rir e sem olhar para ele. Mais adiante, encontrarás um castelo; deixa cair esta varinha na soleira da porta; em seguida vai sempre para a frente, atravessa-o todo e sai pelo lado posterior. Lá encontrarás um velho poço, dentro do qual cresceu uma grande árvore, onde verás dependurada uma gaiola com um pássaro dentro; pega essa gaiola, tira do poço um copo de água e volta pelo mesmo caminho já percorrido. Na soleira da porta, torna a pegar a varinha e, quando passares perto do cão preto, bate-lhe no focinho, mas procura acertar-lhe; depois vem comigo aqui.A menina encontrou tudo exatamente como lhe dissera a velha e, quando ia voltando do castelo, no caminho encontrou os dois irmãos que haviam percorrido meio mundo. Reuniram-se os três e foram até onde se achava o cão preto deitado no meio da rua; a menina bateu-lhe no focinho e ele, imediatamente, transformou-se num belo príncipe, o qual acompanhou os irmãos até o rio.A velha ainda estava lá e alegrou-se muito por vê-los todos juntos; transportou-os para a outra margem, depois foi-se embora, também, pois já se havia quebrado o seu encanto. Os moços dirigiram-se todos à casa do pescador, alegres e felizes por estarem novamente reunidos e lá dependuraram a gaiola, com o pássaro dentro, numa parede da casa.O segundo rapaz, porém, não conseguia ficar sossegado dentro de casa; então pegou o arco e saiu a caçar. Depois de andar de um lado para outro, sentiu-se cansado; sentou-se no chão, tirou do bolso a sua flautinha e tocou uma melodia. O rei, que estava caçando aí por perto, ouviu-o; aproximou-se do jovem e perguntou:- Quem te deu licença de caçar por estas bandas?- Oh, ninguém! - respondeu o rapaz.- Quem és tu?- Sou filho do pescador.- Mas o pescador não tem filhos!- Se não acreditas, vem comigo.O rei acompanhou-o à casa do pescador; fêz-lhe muitas perguntas e ele contou o que sabia. Nisso o passarinho preso na gaiola pôs-se a cantar:
- A pobre mãe solitária,trancada está na prisão.O rei, sangue de heróis;estes três são filhos teus.As pérfidas irmãs invejosas.n'água os atiraram pressurosas.cada um por sua vez;mas nenhum se afogou,pois o bom pescador os salvou!
Todos que estavam aí presentes ficaram horrorizados com a história contada pelo pássaro; então o rei conduziu os filhos, o pássaro e o pescador para o castelo. Mandou buscar a esposa na prisão, aparecendo ela, muito doente e enfraquecida. A filha mais que depressa, deu-lhe a beber a água trazida do poço e ela recuperou, prontamente, as forças e a saúde.Depois o rei condenou as duas cunhadas, que acabaram a triste vida na fogueira.E a filha do rei casou-se com o belo príncipe, vivendo todos muito felizes durante longos anos.Este episódio é-lhe oferecido por Podbean.com.
Wednesday Aug 14, 2024
Wednesday Aug 14, 2024
Era uma vez viveu um camponês e sua esposa, e o pároco da aldeia tinha uma fantasia para a esposa, e tinha desejado um longo tempo para passar um dia inteiro feliz com ela. A mulher camponesa, também, estava muito disposto. Um dia, por isso, ele disse à mulher: "Ouça, meu querido amigo, eu já pensou em uma maneira pela qual podemos, por uma vez passar um dia inteiro juntos e felizes.
Eu vou te dizer o que; na quarta-feira, você deve levar para a cama, e informe o seu marido está doente, e se você só reclamar e agir corretamente estar doente, e continuar fazendo isso até domingo, quando eu tenho que pregar, então vou dizer em meu sermão que quem tem em casa uma criança doente, um marido doente, uma mulher doente, um pai doente, a mãe doente, um irmão doente ou qualquer que seja, e faz uma peregrinação ao monte Göckerli na Itália, onde você pode obter uma peck de louro-folhas para um kreuzer, 3 a criança doente, o marido doente, a esposa doente, o pai doente, ou a mãe doente, a irmã doente, ou qualquer que seja, será restaurado para a saúde imediatamente."
"Eu vou administrá-la," disse a mulher prontamente. Agora, pois, na quarta-feira, a camponesa levou para sua cama, e se queixou e lamentou tal como acordado, e seu marido fez tudo por ela que ele poderia pensar, mas nada fez-lhe qualquer bom, e quando chegou o domingo, a mulher disse, "Eu me sinto tão mal como se eu fosse morrer de uma vez, mas há uma coisa que gostaria de fazer antes de minha parte, gostaria de ouvir o sermão do pároco que ele está indo para pregar a-dia." Por que o camponês disse: "Ah, meu filho, não faça isso"
"tu poderias fazer-te pior se tu fosses para chegar até Olha, eu vou para o sermão, e vai atendê-la com muito cuidado, e vai contar. te tudo o pároco diz."
"Bem," disse a mulher, "vai, então, e prestar muita atenção, e repetir para mim tudo o que tu ouves." Assim, o camponês foi para o sermão, e o pároco começou a pregar e disse: se alguém tinha em casa uma criança doente, um marido doente, uma mulher doente, um pai doente a mãe doente, uma irmã doente, irmão ou qualquer um outra coisa, e faria um pilgimage ao morro Göckerli na Itália, onde um beijinho de louro-folhas custa kreuzer, a criança doente, marido doente, esposa doente, o pai doente, mãe doente, irmã doente, irmão, ou qualquer que ele poderia ser, seria restaurada para a saúde instantaneamente, e todo aquele que desejava empreender a viagem era para ir com ele depois que o culto terminou, e ele lhe daria o saco para os laurel-folhas ea kreuzer.
Então, ninguém foi mais do que o camponês se regozijaram, e após o serviço acabou, ele foi imediatamente para o pároco, que lhe deu a bolsa para os laurel-folhas ea kreuzer. Depois disso, ele foi para casa, e até mesmo na porta da casa, ele gritou: "querida esposa Hurrah! Agora é quase a mesma coisa que se tu fosses bem!
O pároco tem pregado a-dia que todo aquele que tinha em casa uma criança doente, um marido doente, uma mulher doente, um pai doente, a mãe doente, uma irmã doente, irmão ou quem quer que seja, e gostaria de fazer uma peregrinação ao monte Göckerli na Itália, onde um beijinho de louro-folhas custa kreuzer, a criança doente, marido doente, esposa doente, o pai doente, mãe doente, irmã doente, irmão, ou qualquer que ele estava, seria curada imediatamente, e agora eu já tenho o saco eo kreuzer do pároco, e vai em uma vez começar a minha jornada para que tu possas chegar bem mais rápido ," e por isso ele foi embora.
Ele foi, no entanto, dificilmente ido antes a mulher levantou-se, e o pároco estava lá diretamente.
Mas, agora, vamos deixar estes dois por um tempo, e siga o camponês, que andou rapidamente, sem parar, a fim de obter o mais cedo à colina Göckerli, e no seu caminho, ele conheceu sua fofoca. Sua fofoca era um comerciante de ovo, e estava vindo do mercado, onde ele tinha vendido os seus ovos. "Que vocês sejam abençoados," disse a fofoca, "onde você está fora de tão rápido?"
"Para toda a eternidade, meu amigo," disse o camponês, "minha esposa está doente, e eu tenho sido a-dia para ouvir o sermão do pároco, e ele pregou que, se qualquer um tinha em sua casa um filho doente, um marido doente, a esposa doente, um pai doente, uma mãe doente, uma irmã doente, irmão ou qualquer outra pessoa, e fez uma peregrinação ao monte Göckerli na Itália, onde um beijinho de louro-folhas custa kreuzer, a criança doente, o marido doente, a esposa doente, o pai doente, a mãe doente, a irmã doente, irmão ou qualquer que ele estava, seria curada imediatamente, e então eu tenho o saco para o louro-folhas ea kreuzer do pároco, e agora eu estou começando minha peregrinação."
"Mas escute, fofocas," disse o egg-comerciante para o camponês, "é você, então, estúpido o suficiente para acreditar que tal coisa como que Você não sabe o que significa O pároco quer passar um dia inteiro? sós com sua esposa em paz, para que ele lhe deu este trabalho a fazer para tirá-lo do caminho ."
"A minha palavra!" disse o camponês. "Como eu gostaria de saber se isso é verdade!"
"Venha, então," disse a fofoca: "Eu vou te dizer o que fazer entrar no meu ovo-basket e eu vou levá-lo para casa, e então você vai ver por si mesmo." Assim que foi liquidada, e as fofocas colocar o camponês em seu ovo-basket e levou-o para casa.
Quando chegaram à casa, hurra! mas tudo estava indo feliz lá! A mulher tinha já tinha quase tudo morto que estava no pátio, e tinha feito panquecas, e o pároco estava lá, e tinha trazido seu violino com ele. A fofoca bateu à porta, e uma mulher perguntou quem estava lá. "Sou eu, a fofoca," disse o egg-comerciante, "dê-me abrigo esta noite, eu não vendi meus ovos no mercado, então agora eu tenho que levá-los para casa novamente, e eles são tão pesadas que jamais ser capaz de fazê-lo, pois já está escuro."
"Na verdade, meu amigo," disse a mulher, "tu vires em um momento muito inconveniente para mim, mas como tu aqui não pode ser ajudado, entrar e tomar um banco lá no banco ao lado do fogão." Em seguida, ela colocou a fofoca ea cesta que ele carregava em suas costas no banco ao lado do fogão. O pároco, no entanto, ea mulher, eram tão feliz quanto possível. Por fim, o pároco disse: "Ouça, meu caro amigo, tu podes cantar lindamente;. Cantar algo para mim"
"Oh," disse a mulher, "eu não posso cantar agora, na minha juventude, na verdade eu poderia cantar bem o suficiente, mas que está tudo acabado agora."
"Venha," disse o pároco, mais uma vez, "não cantar algumas pequena canção." Por que a mulher começou e cantou,
"Eu enviei o meu marido longe de mimPara o morro Göckerli na Itália."
Então, o pastor cantou,
"Eu queria que 'twas um ano antes de ele voltou,Eu nunca pedir-lhe o saco laurel-folha.Aleluia ."
Em seguida, a fofoca que estava no fundo começou a cantar (mas eu devo dizer-lhe que o camponês foi chamado Hildebrand), de modo a fofoca cantou,
"O que estás a fazer, meu caro Hildebrand,Há no banco ao lado do fogão tão perto?Aleluia ."
E então o camponês cantou de sua cesta,
"Tudo o que eu sempre canto odiarão a partir deste dia,E aqui neste cesto já não vou ficar.Aleluia ."
E ele saiu do cesto, e cudgelled o pároco para fora da casa.Este episódio é-lhe oferecido por Podbean.com.
Wednesday Aug 14, 2024
Wednesday Aug 14, 2024
Houve, uma vez, um campônio que não possuía nem um pedaço de terra, apenas uma casinha e a filha. Esta, um dia, disse ao pai:- Deveríamos pedir ao rei que nos desse uma quadra de terra.O rei, ao saber que eram tão pobres, deu-lhes um lote que não passava de um torrão cheio de mato. Pai e filha puseram-se, com afinco, a capinar e a revolver aquela pobre terra a fim de semear algum trigo e hortaliças. Já haviam cavoucado quase todo o torrão quando acharam, semi-enterrado, um pequeno pilão de ouro maciço.- Escuta aqui, - disse o pai, - como o nosso rei foi tão generoso conosco e nos deu este campo, acho que deveríamos dar-lhe este pilão como prova de reconhecimento.A filha não era da mesma opinião e objetou:- Meu pai, se lhe levarmos o pilão há de querer também a mão-de-pilão e teremos de a procurar; portanto acho melhor ficarmos calados.O pai, entretanto, não lhe deu atenção; embrulhou o pilãozinho e foi levá-lo ao rei, contando-lhe que o haviam achado no meio da terra e que desejavam oferecer-lho. O rei aceitou o pilão mas perguntou se não haviam achado mais nada.- Não, Majestade; - respondeu o camponês.O rei disse-lhe:- É preciso trazer, também, a mão-de-pilão.O camponês respondeu que haviam procurado mas não conseguiram encontrá-la. Essa explicação de nada serviu e o rei mandou que o trancassem na prisão até que tivessem encontrado o tal objeto. Diariamente, os guardas levavam ao camponês a ração de pão e água, que é o que dão nas prisões, e sempre o ouviam lamentar-se e exclamar:- Ah, se eu tivesse dado atenção à minha filha!Tanto ouviram essa exclamação que resolveram ircontar ao rei, repetindo o que sempre dizia o prisioneiro: "Ah, se eu tivesse dado atenção à minha filha!" contando ainda que ele não queria comer nem beber nada.O rei, então, mandou buscar o prisioneiro e perguntou-lhe por que era que vivia a repetir: "Ah, se eu tivesse dado atenção à minha filha!"- Que foi que tua filha disse?- Majestade, ela disse-me que não trouxesse o pilãozinho, senão teria que achar também a mão-de-pilão.- Tens uma filha bem inteligente, manda que venha cá.Assim a moça teve de comparecer à presença do rei, o qual lhe perguntou se realmente era tão sagaz e inteligente. A fim de prová-lo, ele lhe daria um enigma para resolver; se o conseguisse decifrar ele se casaria com ela.A moça respondeu prontamente que o decifraria; então o rei disse:- Tens de te apresentar na minha presença nem vestida, nem nua; nem montada, nem de carro; nem na rua, nem fora dela; se conseguires fazer isso, casarei contigo.A moça retirou-se. Em seguida, despiu-se completamente, assim não estava vestida; envolveu-se numa rede de pescar e não estava nua; tomou emprestado um burro amarrando-lhe as pontas da rede no rabo para que ele a puxasse, assim não estava montada e nem de carro; fez o burro andar sobre o sulco produzido pelas rodas do carro de maneira a tocar o chão só com o dedo maior, desse modo não estava nem na estrada nem fora dela.Quando o rei a viu chegar disse-lhe que havia acertado completamente. Mandou soltar o pai dela e, em seguida, desposou-a, confiando à sua sagacidade a gerência cio patrimônio real.Transcorridos alguns anos, um dia em que o rei passava em revista uma divisão, deu-se o caso que muitos camponeses se detivessem cm frente ao castelo com os carros depois de terem vendido a lenha; alguns tinham atrelado bois e, outros, cavalos. Entre eles havia um camponês que tinha três cavalos e um potrinho recém-nascido, o qual saiu de perto da mãe e correu a refugiar-se entre dois bois que puxavam um carro. Os respectivos donos puseram-se a discutir e a brigar aos berros; o dono dos bois queria para si o potrinho, dizendo que era filho dos bois; o outro insistia dizendo que o potrinho lhe pertencia e que era filho dos cavalos.A contenda foi levada ao rei e este sentenciou que o potrinho devia ficar no lugar que escolhera; assim ficou pertencendo ao dono dos bois, embora injustamente. O outro camponês foi-se embora chorando e lastimando-se por ter perdido o potrinho.Mas ele ouvira dizer que a rainha era muito inteligente e sagaz, além de boa e compreensiva, por ser também de origem camponesa; dirigiu-se a ela pedindo que o ajudasse a recuperar o seu potrinho. Ela respondeu:- Sim, eu te ajudarei. Se prometes não me trair, eu te ensinarei o que tens a fazer. Amanhã cedo, quando o rei for assistir à parada, coloca-te no meio da rua pela qual deve passar, pega uma rede de pesca e finge estar pescando; continua a pescar e a despejar a rede como se realmente estivesse cheia de peixes.Ensinou-lhe, também, as respostas que devia dar se o rei interrogasse.Na manhã seguinte, lá estava o camponês pescando em lugar seco. Passando por aí o rei viu-o e mandou o batedor perguntar o que fazia aquele maluco. Perguntado, o camponês respondeu:- Estou pescando.O batedor perguntou-lhe que pretendia pescar em plena rua, onde não havia água.- Ora, - respondeu o camponês, - se dois bois podem produzir um potrinho, eu também posso pescar onde não há água.O batedor foi transmitir essa resposta ao rei, o qual mandou chamar o camponês e lhe disse que aquela ideia não era produto da sua cachola; quem lha tinha sugerido? Exigiu que o confessasse logo. Mas o camponês não queria faltar ao compromisso com a rainha e repetia: "Deus me livre, Deus me livre! É ideia minha, é ideia minha."Então, colocaram-no sobre um feixe de palha e espancaram-no tanto que o coitado acabou confessando que fora a rainha.À tarde, chegando em casa, o rei foi ter com a rainha, dizendo-lhe:- Por quê és tão falsa para comigo? Não te quero mais por esposa; está tudo terminado entre nós. Volta para a tua casa campônia, de onde vieste.Todavia, permitiu que ela levasse consigo a coisa mais cara a preciosa que possuía e essa seria a sua gratificação.- Sim, meu querido esposo, - disse ela, - farei o que mandas.Lançou-se ao pescoço do rei abraçando-o e beijando-o muito, dizendo que desejava despedir-se dele. Mandou que servissem uma bebida qualquer para brindar à saúde do rei e, disfarçadamente, deitou no copo deste um narcótico, que o fez cair em profundo sono; vendo-o adormecido, a rainha mandou que lhe trouxessem um belo lençol de linho, no qual envolveu o rei; em seguida, ordenou aos criados que o levassem para a carruagem, estacionada em frente à porta, e ela mesma o conduziu depois até à sua casa.Uma vez lá na sua casinha, ela deitou-o na própria cama onde ele dormiu um dia e uma noite ininterruptamente. Quando acordou, olhou espantado em volta, exclamando:- Meu Deus, onde estou?Chamou os criados mas não haviam nenhum. Por fim chegou a mulher, que entre um sorriso e outro, disse-lhe:- Meu caro senhor, destes-me ordem de trazer comigo o que eu mais gostava e me era mais precioso; ora, nada no mundo me é mais caro e precioso do que vós, assim trouxe-vos comigo.O rei ficou tão comovido que os olhos se lhe encheram de lágrimas.- Minha querida mulher, tu és minha e eu sou teu, e nada nos separará.Reconduziu-a, novamente, ao paço real e quis que se tornassem a casar.Certamente, se não morreram, ainda estão vivos até hoje.Este episódio é-lhe oferecido por Podbean.com.
Wednesday Aug 14, 2024
Wednesday Aug 14, 2024
Houve, uma vez, uma rainha cuja filhinha pequena, ainda de colo, era impertinente até não se aguentar. Certo dia, a menina estava tão mal humorada que era impossível aturá-la; a mãe lançou meio de todos os recursos para acalmá-la, mas em vão.Querendo distraí-la, a rainha abriu a janela e, vendo alguns corvos esvoaçando em volta do castelo, disse, num assomo de impaciência:- Gostaria que fosses um corvo, pelo menos estarias voando e brincando lá com os outros e me deixarias em paz.Mal acabou de pronunciar essas palavras, eis que a menina se transformou, subitamente, num corvo e saiu dos braços da mãe pondo-se a voar pela janela fora. Foi voando diretamente para a floresta, onde ficou durante muito tempo e seus pais nada mais souberam dela.Passados alguns anos, certo dia um jovem atravessava a floresta e, de repente, ouviu uma voz; olhou para todos os lados sem descobrir ninguém. A voz tornou a fazer-se ouvir, então olhando naquela direção, viu, pouco distante, um corvo e compreendeu que era ele quem estava falando.- Escuta, meu jovem, - dizia o corvo; - eu sou filha de um rei e alguém me encantou, transformando-me em corvo. Tu, se quisesses, poderias libertar-me!- E que devo fazer para isso? - perguntou o jovem.- Continua andando sempre para diante na floresta; lá ao longe, encontrarás uma casinha habitada por uma velha. Ao chegares lá, ela te virá ao encontro e te oferecerá de comer e beber, mas nada aceites; pois, se comeres ou beberes alguma coisa, cairás em sono profundo e perderás a oportunidade de me libertar. No jardim atrás da casa, há um montículo de tufo, senta-te lá em cima e fica esperando por mim. Durante três dias, às duas horas da tarde, chegarei numa carruagem. No primeiro dia, a carruagem virá puxada por quatro cavalos brancos; no segundo dia, por quatro cavalos alazões, e no terceiro dia, por quatro cavalos negros. Porém, se não estiverdes acordado e eu te encontrar dormindo, não me poderei libertar.O jovem prometeu fazer tudo quanto ela lhe pedia, mas, ao despedir-se, o corvo disse, suspirando:- Prevejo que não me libertarás; acabarás por aceitar qualquer coisa da velha e cairás em sono pesado!O jovem protestou, dizendo que nada aceitaria e, mais uma vez, reiterou promessa de ajudá-la. Mas quando chegou à casa indicada, saiu de dentro a velhinha, dizendo:- Ah, pobre homem! Como estás esfalfado! Descansa um pouco e come alguma coisa para refazer as forças.- Não, - disse o homem, - não quero comer nem beber nada.A velha, porém, insistiu com muita habilidade até que, sem jeito de continuar recusando, o homem aceitou um gole de bebida. Depois agradeceu e foi postar-se no monte de tufo a fim de aguardar a chegada do corvo. Assim que sentou, foi tomado de tal canseira que teve de deitar-se um pouco para descansar, mas com a firme intenção de não se deixar vencer pelo sono. Os olhos, porém, logo se lhe fecharam e ele caiu em sono tão pesado que nada deste mundo conseguiria acordá-lo.Às duas horas em ponto, chegou o corvo, na bela carruagem puxada por quatro cavalos brancos, mas vinha muito triste, dizendo para si mesmo: eu sei que o encontrarei dormindo! De fato, quando chegou ao jardim viu que ele estava dormindo realmente. Então, desceu da carruagem e, aproximando-se dele, sacudiu-o várias vezes, chamando-o em voz alta, mas em vão; o homem não acordou.No dia seguinte, ao meio-dia, a velha foi levar-lhe comida e bebida mas ele não queria aceitar nada; contudo, a velha tanto fez e tanto disse que ele acabou por beber um pouco do copo que ela lhe apresentava.Por volta das duas horas, ele dirigiu-se ao monte de tufo no jardim a fim de aguardar o corvo; mas, também dessa vez, a canseira era tão grande que não conseguia ficar de pé, obrigando-o a deitar-se. Imediatamente, ferrou em sono profundo. As duas horas, chegou o corvo na carruagem puxada por quatro cavalos alazões; vinha tristonho, pois sabia que o encontraria dormindo. Desceu da carruagem e tentou despertá-lo; chamou-o, sacudiu-o, em vão; nada o despertava.No dia seguinte, a velha censurou-o porque não queria comer nem beber, dizendo:- Onde já se viu, passar tanto tempo sem comer nem beber! Quer por acaso morrer?O homem continuava a recusar tudo; a velha, porém, colocou em frente um prato bem cheio de comida e um copo de vinho; ao sentir aroma tão apetitoso, o homem não resistiu e bebeu um gole de vinho. Em seguida, foi ao jardim a fim de aguardar a princesa encantada; mas sentiu ainda maior cansaço que nos dias precedentes; então, deitou-se um pouco e não tardou a adormecer como uma pedra.As duas horas, chegou o corvo na carruagem puxada por quatro cavalos pretos; desceu dela e fez o impossível para despertá-lo; sacudiu-o, chamou-o, inutilmente. Então, colocou junto dele um pão, um pedaço de carne e uma garrafa de vinho, que tinham a propriedade de nunca acabar. Depois, enfiou-lhe no dedo um anel, dentro do qual havia o seu nome gravado e, por último, deixou-lhe uma carta, explicando direitinho tudo o que lhe deixava e tudo o que havia acontecido, dizendo mais: "vejo bem que aqui não és capuz de me libertar; contudo, se desejas realmente fazê-lo, vem ter comigo no castelo de ouro de Stromberg. Podes bem fazê-lo, eu sei com toda a certeza." Em seguida, voltou para a carruagem coberta de luto e rumou, velozmente, para o castelo de ouro de Stromberg.Assim que acordou, percebendo que dormira bastante, o jovem ficou extremamente aflito e murmurou:- Certamente ela já passou por aqui e deve ter ficado aborrecida, pois não a libertei!Nisso, caiu-lhe sob o olhar as coisas aí deixadas; pegou imediatamente na carta e leu o que continha; assim ficou sabendo o que acontecera e, também, o que ainda podia fazer. Levantou-se depressa e pôs-se a caminho em procura do castelo de ouro, embora não sabendo onde o mesmo se situasse.Já havia corrido mundo a valer, quando chegou a uma floresta muito densa; vagueou por ela durante quinze dias sem encontrar o caminho de saída. Uma tarde, em que as sombras da noite baixavam mui rapidamente, deixou-se cair junto de uns arbustos, para descansar, pois já não podia mais de tão cansado, e não tardou a adormecer. Pela manhã do dia seguinte, continuou a perambular e, ao anoitecer, quis novamente deitar-se ao pé de uma moita para descansar e dali a pouco ouviu gemidos e lamentos tão altos que o impediram de dormir. Na hora em que é costume acenderem-se as luzes, ele viu uma luzinha brilhando não muito distante; levantou-se depressa e dirigiu-se em sua direção.Andou um pouco e chegou a uma grande casa que, de longe, porém, parecia pequena, porque estava meio escondida atrás de um gigante. O jovem estacou, pensando: "Se entras e o gigante te descobre, és um homem liquidado!" Todavia, armando-se de coragem, foi-se aproximando. Assim que o gigante o viu, gritou:- Oh, chegas em boa hora; já faz muito tempo que não como nada! Vou engulir-te já como jantar.- Deixa disso, - respondeu o jovem, - não gosto de ser engolido; se queres comer tenho aqui o bastante para te satisfazer o apetite.- Se é verdade o que dizes, então podes ficar sossegado que não te comerei; falei em engolir-te porque estou com muita fome e nada tenho para comer.Sentaram-se à mesa e o homem pôs-se a servir pão, carne e vinho até não acabar mais.- Gosto muito disto, - disse o gigante, e comeu à vontade.Daí a pouco o jovem perguntou:- Podes indicar-me onde fica o castelo de ouro de Stromberg?- Vou procurar no mapa que tem todas as cidades, aldeias e casas. Foi ao quarto buscar o mapa e procurou o castelo, mas não constava.- Não importa, - disse o gigante, - tenho outros mapas mais completos lá no armário; talvez encontremos o que procuras.Procuraram inutilmente, o castelo não constava. O homem queria continuar o caminho mas o gigante pediu- lhe que esperasse ainda alguns dias, até seu irmão voltar; não demoraria, fora aí por perto em busca de víveres.Quando o irmão do gigante voltou, perguntaram-lhe se sabia onde ficava o tal castelo; ele respondeu:- Depois do almoço, quando matar a fome, procurarei no mapa.Mais tarde subiram os três ao quarto do segundo gigante e procuraram em todos os mapas aí existentes, em todos os velhos papéis, e tanto procuraram que acabaram por descobrir o castelo de Stromberg. Mas ficava a muitas e muitas milhas de distância.- Ah, - disse tristemente o jovem, - como poderei chegar lá?- Eu tenho duas horas de tempo disponíveis, - disse o gigante, - posso levar-te só até às vizinhanças, porque preciso estar de volta logo para amamentar o menino que temos.Assim fizeram. O gigante levou-o até um lugar que ficava a duzentas horas do castelo, dizendo que o resto do caminho podia fazê-lo sozinho. Com isso voltou, e o homem continuou a andar dia e noite até que por fim chegou ao castelo de ouro de Stromberg. O castelo porém, fora construído sobre uma montanha toda de vidro. A princesa encantada tivera de percorrer, em volta, toda a montanha até poder entrar. O homem ficou muito contente vendo-a lá e queria subir até ela, mas, cada vez que tentava subir, tornava a deslizar pelo vidro abaixo. E, vendo que não o conseguia, pensou consigo mesmo: "ficarei esperando por ela aqui em baixo."Então, construiu uma pequena cabana e ficou aí um ano inteiro; todos os dias avistava a princesa passeando de carruagem no alto da montanha, mas ele não podia ir ter com ela. Certo dia, estando na choupana, viu três bandidos brigando e se esmurrando; então gritou-lhes:- Deus esteja convosco!Ao ouvir esse grito os bandidos estacaram, olhando de um lado para outro, mas, não vendo ninguém, recomeçaram a esmurrar-se com mais vigor. O homem gritou pela segunda vez:- Deus esteja convosco!Os bandidos tornaram a olhar em volta, mas, não vendo ninguém, voltaram à luta. O homem gritou pela terceira vez:- Deus esteja convosco! - pensando: "vai lá ver por que é que estão se esmurrando."Foi e perguntou aos bandidos a razão daquela luta; então um deles disse que tinha achado um pau que tinha o poder de abrir qualquer porta em que batesse. O segundo disse que tinha achado um capote e quem o vestisse se tornaria invisível, e o terceiro disse que tinha achado um cavalo com o qual era possível ir a qualquer lugar, mesmo ao cimo da montanha de vidro. E agora estavam brigando porque não chegavam a um acordo: não sabiam se ficar com os objetos em comum, ou reparti-los e cada qual ir-se com o seu achado. O homem então propôs:- Eu quero fazer uma troca com esses objetos; dinheiro, na verdade, não tenho; mas possuo algo que vale muito mais. Antes porém, quero experimentar se o que dissestes é realmente certo.Os três bandidos aceitaram a proposta. Deixaram- no montar no cavalo, vestiram-lhe o capote e puseram-lhe na mão o pau; de posse de tudo isso, o homem tornou-se invisível; então pegou no pau e espancou valentemente os três bandidos, gritando:- Ai tendes o que mereceis, seus vagabundos! Estais satisfeitos?E saiu a correr pela montanha acima; quando chegou ao alto, encontrou o portão do castelo fechado; bateu-lhe com o pau e logo ele se escancarou. Entrou e subiu as escudas indo até onde se encontrava a princesa, que estava sentada numa sala, tendo em frente uma taça de ouro cheia de vinho. Como, porém, ele estivesse com o capote mágico que o tornava invisível, ela não podia vê-lo; por isso, chegando à sua presença, o homem tirou do dedo o anel que ela lhe dera e atirou-o dentro da taça, que tilintou. A princesa exclamou alegremente:- O meu anel!... O jovem que me vem libertar deve estar aí!Correu a procurá-lo por todo o castelo sem conseguir encontrá-lo. Ele saira do castelo e, montando no cavalo, despira o capote. Quando a princesa foi lá fora deu com ele e ficou radiante de alegria.Descendo do cavalo, o jovem tomou a princesa nos braços e ela beijou-o muito feliz, dizendo:- Agora me libertaste do encanto; amanhã realizaremos nosso casamento.Este episódio é-lhe oferecido por Podbean.com.
Wednesday Aug 14, 2024
Wednesday Aug 14, 2024
Um certo mercador tinha dois filhos, um menino e uma menina, ambos muito novos, que ainda não sabiam andar. Ele possuía dois navios ricamente carregados viajando pelos mares onde embarcara toda sua riqueza na esperança de conseguir grandes lucros, quando chegaram notícias de que sua fortuna tinha desaparecido. Assim, de homem rico que era, tornou-se muito pobre, tão pobre que só lhe restara um pedacinho de terra. Para aliviar um pouco as preocupações de sua cabeça, costumava caminhar por ali.Certo dia em que estava perambulando em seu terreno, um anãozinho de cara enrugada apareceu à sua frente perguntando por que estava tão triste e o que confrangia tão profundamente seu coração. Mas o mercador replicou, "Se me pudesse fazer algum bem eu lhe contaria." - "Quem sabe se não posso?," disse o homenzinho. "Conte-me qual é o caso e talvez eu possa servir para alguma coisa." O mercador contou-lhe então como toda sua riqueza havia ido para o fundo do mar e como ele nada possuía exceto aquele pedacinho de chão. "Oh! Não se preocupe com isto," disse o anão, "apenas prometa trazer-me, daqui a doze anos, aquilo que primeiro vier ao seu encontro quando voltar para casa e eu lhe darei todo ouro que quiser."O mercador pensou que não era uma exigência muito grande, que muito provavelmente encontraria primeiro seu cão ou algo do gênero, mas esqueceu-se de seus filhinhos, por isso aceitou a barganha e assinou e selou o compromisso de cumprir a promessa. Ao se aproximar de casa, porém, seu garotinho ficou tão contente ao vê-lo, que engatinhou atrás dele e agarrou-se a suas pernas. O pai teve um sobressalto, pensando no pacto que havia feito, mas como não apareceu ouro algum, consolou-se pensando que tudo não passara de uma brincadeira do anão.Cerca de um mês mais tarde, ele subiu as escadas de um velho depósito de lenha à procura de algum ferro velho para vender e levantar algum dinheiro, e ali encontrou uma grande pilha de ouro sobre o chão. À vista disto, ficou muito satisfeito, voltou aos negócios e tornou-se um grande mercador como antes.Entretanto, seu filho ia crescendo, e com a aproximação do término do prazo de doze anos, o mercador foi ficando tão aflito e pensativo que sua tristeza e seus cuidados se estampavam em seu rosto. O filho perguntou-lhe certo dia o que estava acontecendo, mas o pai recusou-se a contar; mas, passado algum tempo, acabou contando que, sem o saber, vendera-o a um anãozinho de aparência repelente por uma grande quantia de ouro; e que estava se aproximando o término dos doze anos, ao fim dos quais teria que cumprir o acordo. Então o filho disse, "Pai, não se preocupe muito com isso; pode contar que eu darei um jeito no homenzinho."Quando chegou o momento, eles foram juntos até o lugar indicado e o filho riscou um círculo no chão e colocou-se junto com o pai em seu interior. O anãozinho logo apareceu e disse ao mercador, "Trouxe o prometido?" O velho ficou em silêncio, mas seu filho respondeu, "O que você quer aqui?" O anão respondeu, "Vim falar com seu pai, não com você." - "Você enganou e traiu meu pai," disse o filho. "Liberte-o de seu compromisso." - "Não," replicou o outro, "não abrirei mão de meus direitos."Isto provocou uma longa discussão ao fim da qual todos concordaram em que o filho seria colocado num bote que ficava ao lado de um rio não muito distante, e que o pai deveria empurrá-lo com a própria mão para que ele fosse deixado à deriva. O filho despediu-se então do pai e acomodou-se no barco; e quando este foi empurrado, adernou e caiu de lado na água, fazendo o mercador pensar que o filho houvesse morrido. O pai voltou para casa profundamente entristecido.Mas o barco não havia afundado e seguira navegando, e o rapaz ficou sentado dentro dele até encalhar numa terra desconhecida. Quando saltou na praia, viu à sua frente um lindo castelo cujo interior estava vazio e desolado por estar encantado. Andando pelo castelo, acabou encontrando uma serpente branca num dos quartos. Ora, a serpente branca era uma princesa encantada que se alegrou enormemente ao vê-lo e disse, "Vieste finalmente me libertar? Esperei doze longos anos por ti, pois somente tu podes me salvar. Esta noite, doze homens virão; suas faces serão pretas e eles estarão encadeados em correntes. Eles perguntarão a ti o que fazes aqui, mas fica em silêncio, não responde e deixa que façam o que quiserem - bater-te e torturar-te. Suporta tudo, só não fala nenhuma palavra e à meia-noite eles partirão. Na segunda noite, outros doze virão; e na terceira noite, serão vinte e quatro que irão até mesmo cortar tua cabeça. Mas às doze horas daquela noite, seu poder desaparecerá, e eu estarei livre e virei te trazer a água da vida, e com ela te lavarei e restaurarei tua vida e saúde."Tudo se passou como a princesa encantada havia dito; o filho do mercador não falou uma palavra e, na terceira noite, a princesa apareceu e caiu em seu pescoço e o beijou; alegria e satisfação explodiram por todo o castelo; as bodas foram celebradas e ele se tomou o rei da Montanha Dourada.Eles viveram juntos muito felizes e a rainha teve um filho. Oito anos haviam se passado quando o rei lembrou-se de seu pai: seu coração se comoveu e ele ficou ansioso para revê-lo. A rainha se opunha a sua ida dizendo, "Sei perfeitamente os infortúnios que virão." Ele não lhe deu descanso, porém, até ela consentir. Quando ia partir, ela o presenteou com um anel mágico dizendo, "Leva este anel e coloca-o no dedo; tudo que desejares, ele realizará: somente prometa que não o usarás para levar-me daqui até a morada de teu pai." Ele prometeu o que ela pedia, colocou o anel no dedo e desejou estar perto da cidade onde seu pai morava. Achou-se num instante diante dos seus portões, mas os guardas não quiseram deixá-lo entrar por estar vestido tão estranhamento. Ele foi então a uma montanha vizinha onde morava um pastor, tomou emprestado seu velho manto e assim entrou disfarçadamente na cidade. Quando chegou à casa do pai, contou-lhe que era seu filho, mas o mercador não quis acreditar, dizendo-lhe que havia tido apenas um filho que morrera havia muito tempo, e como ele estivesse vestido como um pobre pastor, nem mesmo lhe ofereceria alguma coisa de comer. O rei insistiu porém em que era seu filho dizendo, "Existe alguma marca pela qual saberias que sou realmente teu filho?" - "Sim," observou a mãe, "nosso filho tinha um sinal na forma de uma framboesa debaixo do braço direito." Ele mostrou-lhes então a marca e eles ficaram satisfeitos por ser verdade o que havia dito. Em seguida ele lhes contou como era rei da Montanha Dourada, e que estava casado com uma princesa, e que tinha um filho de sete anos. Mas o mercador disse, "Isto jamais podería ser verdade; que rei é esse que viaja usando um manto de pastor?" Isto deixou o filho muito irritado e, esquecendo sua promessa, virou o anel e desejou a presença de sua rainha e do filho. Num instante eles estavam diante dele, mas a rainha chorava dizendo que ele havia quebrado a palavra e que uma desgraça aconteceria. Ele fez o que pôde para tranqüilizá-la e ela finalmente pareceu se acalmar; mas não estava realmente calma, apenas meditava como podería vingar-se.Certo dia, ele levou-a para passear fora da cidade para mostrar-lhe o lugar onde seu barco fora colocado à deriva sobre as águas. Ali ele sentou-se dizendo, "Estou muito cansado; senta-te ao meu lado para eu recostar a cabeça em teu colo e dormir um pouco." Mal ele adormecera, porém, ela tirou o anel de seu dedo, afastou-se cuidadosamente e desejou que ela e o filho estivessem cm casa, em seu reino. Quando o rei acordou, achou-se sozinho e percebeu que o anel já não estava em seu dedo. "Jamais poderei retornar à casa de meu pai," disse ele, "diriam que sou um feiticeiro. Viajarei pelo mundo até chegar novamente a meu reino."Assim dizendo, partiu e viajou até chegar a uma montanha onde três gigantes estavam dividindo sua herança; e quando eles o viram, gritaram dizendo, "Os homenzinhos são muito espertos; ele vai dividir a herança entre nós." Ora, esta consistia de uma espada que cortava a cabeça de um inimigo sempre que seu portador dissesse as palavras "Fora cabeças!"; um manto que tornava seu proprietário invisível ou lhe dava qualquer forma que desejasse; e um par de botas que transportava a pessoa que as calçasse para onde ela quisesse ir. O rei lhes disse que primeiro teriam que deixá-lo experimentar esses objetos maravilhosos para conhecer seu valor. Eles lhe entregaram então o manto. Ele desejou ser uma mosca e num instante se transformou numa mosca. "O manto está perfeito," disse ele, "agora entreguem-me a espada." - "Não," disseram eles, "não, a menos que prometa não dizer 'Fora cabeças!' pois se fizer isto, morreremos todos." Assim eles a entregaram com a condição de ele experimentar seu poder apenas numa árvore. Em seguida ele pediu também as botas e no momento em que se viu em posse dos três objetos, desejou estar na Montanha Dourada e ali estava ele no mesmo instante. E os gigantes foram deixados para trás sem herança para dividir ou disputar.Ao se aproximar do castelo, ouviu um som alegre de música e as pessoas em volta lhe disseram que a rainha estava prestes a celebrar seu casamento com outro príncipe. Ele vestiu então o manto, entrou no castelo e colocou-se ao lado de sua rainha onde ninguém o via. Mas quando todas as comidas foram servidas no prato da rainha, ele as pegou e comeu; quando a taça de vinho foi entregue a ela, ele a pegou e bebeu; assim, embora continuassem servindo comida e bebida a ela, seu prato continuava sempre vazio.Diante disso, tomada de medo e remorso, ela foi para seu quarto e pôs-se a chorar. Ele a seguiu até lá. "Ai de mim!," lamentava-se ela. "Não terá chegado o meu libertador? Por que então o feitiço ainda me cerca?." - "Sua traidora!," exclamou ele. "Teu libertador já veio, de fato, e agora está perto de ti: terá ele merecido isto?" E ele saiu dali e dispensou todo mundo dizendo que o casamento estava desfeito porque havia retomado a seu reino: mas a princesa, os nobres e conselheiros zombaram dele. Ele se desentendeu então com todos, exigindo que partissem, por bem ou por mal. Tentaram agarrá-lo, mas ele sacou a espada e, com uma palavra, as cabeças dos traidores rolaram a seus pés. E foi assim que voltou a ser o rei da Montanha Dourada.Este episódio é-lhe oferecido por Podbean.com.
Wednesday Aug 14, 2024
Wednesday Aug 14, 2024
Houve, uma vez, um rei muito rico, que tinha três filhas; todos os dias elas iam passear no jardim do castelo. O rei gostava, imensamente, de árvores raras e entre elas possuia uma macieira pela qual tinha predileção. Tanto gostava dela que ninguém podia tocá-la e, se alguém ousasse comer uma de suas maçãs, ele rogava- lhe praga para que afundasse pela terra a dentro.Quando chegou o outono, as maçãs amadureceram, ficando vermelhas como sangue. As três jovens iam, diariamente, debaixo da macieira com a esperança de que o vento tivesse derrubado alguma maçã; mas em vão, nunca encontravam nada, embora estivesse tão carregada que os galhos pendiam até ao chão.A mais moça das três vivia de água na boca e um dia, não resistindo mais, disse às irmãs:- Nosso pai nos ama demasiado para que sua praga recaia sobre nós; acho que só o fará com os estranhos.Assim dizendo, a jovem colheu uma esplêndida maçã e, dirigindo-se às irmãs, disse-lhes:- Ah, queridas irmãzinhas, provem um bocadinho! Em toda minha vida jamais comi uma fruta tão gostosa.As outras, também gulosas, deram uma dentada na maçã e, imediatamente, as três afundaram pela terra a dentro, desaparecendo para tão longe, onde já não se ouvia o galo cantar, e ninguém ficou sabendo.Ao meio-dia, o rei chamou-as para almoçar. Procurou-as por toda parte e não as encontrou. Muito aborrecido com o desaparecimento delas, mandou anunciar por todo o reino que, quem encontrasse as três princesas, receberia uma delas por esposa.Foi um alvoroço geral; muitos jovens partiram de seus lares, fazendo o impossível para encontrá-las, pois as princesas eram muito queridas pelos seus dotes de bondade, gentileza e beleza. Entre os candidatos, arrolaram- se também três caçadores e, após oito dias de busca incessante, foram dar a um enorme castelo no qual havia salões maravilhosos; num desses salões, viram uma suntuosa mesa, posta, coberta de iguarias doces, tão quentes que ainda fumegavam; mas em todo o castelo, nada se ouvia, nem se via alma viva.Aguardaram ainda meio-dia e as iguarias continuavam sempre quentes e fumegantes; por fim, apertando a fome, resolveram sentar-se à mesa e comer. Depois, decidiram permanecer no castelo e tirar a sorte para que um ficasse de plantão enquanto os outros iriam à procura das princesas. Assim fizeram e, por sorte, coube ao mais velho ficar de plantão.Logo no dia imediato, os dois mais moços sairam à procura das princesas, enquanto o mais velho ficava em casa. Quando deu meio-dia, ele viu chegar um gnomo, o qual lhe pediu um bocadinho de pão; o caçador pegou e cortou uma grande fatia de pão, estendendo-a ao gnomo, que a deixou cair no chão; o gnomo pediu-lhe, por favor, que a apanhasse. O caçador obedeceu e abaixou-se para pegar a fatia, nisso o gnomo agarrou-o pelos cabelos e encheu-o de bordoadas.No dia seguinte, foi a vez do segundo caçador ficar em casa e não teve melhor sorte, Ao anoitecer, quando os outros regressaram, o mais velho perguntou:- Que tal? Como andaram as coisas?- Oh, da pior maneira possível; - respondeu o outro.Um confiou ao outro suas provações, mas nada disseram ao mais moço. Não o suportavam e tratavam-no sempre de João-Bobo, justamente porque era muito simples.No terceiro dia, ficou João-Bobo em casa e os outros foram-se. Ao meio-dia, chegou o gnomo e pediu-lhe um pedaço de pão. O rapaz deu-lhe o pão e o gnomo deixou-o cair, pedindo-lhe que o apanhasse; então João-Bobo respondeu.- Como assim! Não podes apanhá-lo tu mesmo? Se não queres ter trabalho para ganhar teu pão cotidiano, também não mereces comê-lo.O gnomo ficou furioso e exigiu que ele o apanhasse; mas o moço, sem perder tempo, agarrou o gnomo e surrou-o valentemente. O gnomo gritava como um possesso:- Chega, chega! Larga-me; eu to contarei onde estão as princesas.Ouvindo isso, o moço largou-o e o gnomo contou-lhe que havia mais de mil gnomos por aí e que moravam debaixo da terra. Disse-lhe que o seguisse e ele lhe mostraria aonde estavam as princesas. Mostrou-lhe um poço muito fundo mas sem água dentro. Sabia, continuou o gnomo, que seus irmãos não eram sinceros e não tinham boas intenções para com ele; portanto, se quisesse libertar as princesas tinha que agir sozinho. Os dois mais velhos desejavam, também, ardentemente, encontrar as princesas, mas não queriam ter muito trabalho, nem amolações. Deu-lhe, pois, todas as instruções.Antes de mais nada, devia munir-se de um grande cesto, sentar-se dentro com o facão de caça e uma campainha; depois descer ao fundo do poço; lá encontraria três quartos; dentro de cada um deles estava uma princesa guardada por um dragão enorme com muitas cabeças; ele teria de as cortar todas. Após ter dito tudo isso, o gnomo desapareceu.Ao anoitecer, regressaram os outros dois e perguntaram-lhe como tinham corrido as coisas.- Oh, não correram mal de todo! Não vi alma viva até o meio-dia, quando apareceu um gnomo que me pediu um pedaço de pão.Em seguida, contou que, tendo-lhe dado o pão, o gnomo deixara-o cair, pedindo que o apanhasse; como se negasse a fazê-lo, o gnomo enfureceu-se; então, pegara-o e dera-lhe tamanha surra que o gnomo acabara por lhe revelar onde se encontravam as princesas.Os outros dois caçadores ficaram verdes e amarelos de raiva. Mas, na manhã seguinte, foram juntos até onde se achava o poço e lá tiraram a sorte para ver quem desceria primeiro. Tocou ao mais velho, que entrou no cesto munido do facão e da campainha, dizendo:- Quando eu tocar a campainha, puxai-me para cima.Mal acabava de descer, ouviu-se a campainha tocando furiosamente; então puxaram-no depressa para cima. Em seguida, foi o segundo, que procedeu da mesma forma; e, finalmente, chegou a vez do terceiro; entrou no cesto e desceu até ao fundo do poço. Lá saiu, e com o facão de caça na mão postou-se diante de uma porta, a escutar; ouviu o dragão roncando sonoramente. Com muito cuidado, abriu a porta e entrou no quarto, onde viu a princesa mais velha com as nove cabeças do dragão reclinadas no colo. O moço, então, agarrou prontamente a faca e, com alguns vigorosos golpes bem dados, decepou as nove cabeças.A princesa levantou-se de um pulo, atirou-se-lhe aos braços, beijando-o e abraçando-o com grande alegria; em seguida, tirou um colar de ouro vermelho e colocou no pescoço do caçador. Este foi à outra porta e lá viu a segunda princesa, tendo no regaço as sete cabeças de outro dragão; não teve dificuldades em libertar essa também. Depois, foi ao quarto onde estava a mais moça, tendo ao colo as quatro cabeças de outro dragão. E fez o mesmo que fizera aos outros.A alegria das três irmãs era indizível, nunca acabavam de se abraçar e beijar e fazer mil perguntas. Então, João-Bobo agitou, com força, a campainha e, assim que os irmãos lhe mandaram o cesto, fez subir as princesas, uma de cada vez; mas, quando chegou a vez dele, lembrou-se da advertência do gnomo a respeito das más intenções dos irmãos. Então, apanhou uma grande pedra e colocou-a dentro do cesto e, quando este ia subindo e já estava na metade do caminho, os cruéis irmãos cortaram a corda e o cesto despencou com o peso da pedra.Os dois malvados, julgando que João-Bobo tivesse morrido, fugiram mais que depressa com as três princesas, obrigando-as a prometer que diriam ao pai terem sido salvas por eles dois. Chegando ao castelo, pediram as princesas em casamento.Enquanto isso, João-Bobo perambulava sozinho e tristonho por entre os quartos onde matara os dragões, pensando que aí teria que acabar sua pobre vida. Deu com os olhos numa flauta pendurada na parede; muito admirado, perguntou.- Que fazes aí dependurada nessa parede? Aqui ninguém pode sentir-se tão alegre, que tenha vontade de tocar!Depois, contemplou as cabeças dos dragões e disse:- Nem vós podeis me ajudar!E continuou passeando de um lado para outro até o pavimento tornar-se liso. Cansado, teve uma ideia; tirou a flauta da parede e pôs-se a modular qualquer coisa; nisso viu chegar uma quantidade enorme de gnomos. Cada nota que saia da flauta chamava mais outros, e chegaram tantos que ele não os poderia contar.Perguntaram-lhe o que desejava, e ele respondeu que queria regressar à terra e ver a luz do dia. Então os gnomos, todos juntos, cada um pegando num fio de cabelo, sairam voando com ele até à superfície da terra.Uma vez fora do poço, João-Bobo foi direitinho ao castelo, onde faziam os preparativos para as bodas da princesa mais velha; dirigiu-se, diretamente, ao salão emque se achava o rei com as três filhas. Estas, ao vê-lo, ficaram tão assustadas que uma delas desmaiou. Diante disso, o rei enfureceu-se e mandou prendê-lo, julgando que aí estava para fazer algum mal às jovens. Mas quando a princesa recobrou os sentidos, logo pediu ao rei que o pusesse em liberdade. O pai quis saber a razão de tudo aquilo, elas porém disseram que não podiam falar. Achando inútil insistir, o pai disse que poderiam jogar o segredo dentro do fogo; em seguida, retirou-se e foi postar-se atrás da lareira e de lá ouviu tudo o que elas disseram entre si e ao fogo.Em seguida, mandou chamar os dois irmãos perversos e condenou-os à morte. A filha mais moça casou-se com João-Bobo e viveu muito feliz.Eu calcei um par de sapatos de vidro, tropecei numa pedra e o vidro fez tilim e os sapatos se quebraram.Este episódio é-lhe oferecido por Podbean.com.
Wednesday Aug 14, 2024
Wednesday Aug 14, 2024
Houve, uma vez, um camponês que tinha um filho do tamanho de um polegar mas, ao chegar à adolescência, não tinha crescido nem uma linha mais.Certa vez, em que o camponês se dispunha a sair para o campo e arar a terra, o pimpolho chegou-se a ele e disse:- Pai, leva-me contigo!- Queres ir ao campo? - perguntou o pai, - é melhor ficares aqui; lá não ajudas nada e além disso poderias perder-te.Polegarzinho, então, pôs-se a chorar. Para que não o amolasse mais, o camponês meteu-o no bolso e levou-o consigo. Chegando ao campo, tirou o pequeno do bolso e acomodou-o num sulco recém-aberto, deixando-o lá sentado; nisso veio descendo da montanha um enorme gigante e o pai, apontando-o, disse ao menino, pondo-lhe medo para que ficasse quietinho:- Estás vendo aquele monstro? Ele vem buscar-te!Com as longas pernas, o gigante em dois passos chegara junto deles; com dois dedos ergueu delicadamente Polegarzinho, examinou-o bem e, sem proferir palavra, levou-o embora. De tão assustado, o pai ficara imóvel sem abrir a boca, pensando que acabava de perder o filhinho e que jamais o tornaria a ver nesta vida.Entretanto, o gigante levou o pequeno para casa, mandando a mulher que o amamentasse; graças a isso Polegarzinho cresceu rapidamente, tornando-se grande e forte como os gigantes. Decorridos dois anos, o gigante velho levou-o à floresta, querendo experimentá-lo, e disse:- Arranca uma varinha para ti.O rapaz era já tão forte que arrancou da terra uma árvore com raiz e tudo. Mas o gigante não ficou satisfeito e disse:- Deves fazer coisa melhor.Voltou com ele para casa e sua mulher amamentou-o por mais dois anos. Na segunda prova, a força do rapaz havia aumentado a ponto de lhe permitir que arrancasse uma velha árvore troncuda. Mas, nem assim, o gigante se satisfez; entregou-o novamente á mulher por mais dois anos ainda, findos os quais levo-o á floresta, dizendo-lhe:- Arranca uma boa vara que preste!Dessa vez, o rapaz arrancou um enorme carvalho como se estivesse brincando.- Bem, - disse o gigante, - agora chega; já estás habilitado.E levou o rapaz de volta ao campo, onde o havia encontrado. O camponês lá estava empurrando o velho arado. Então o rapaz dirigiu-se a ele, dizendo:- Olha meu pai, que homenzarrão se tornou teu filho!O camponês espantou-se e exclamou:- Não, tu não é o meu filho; nada quero contigo, vai-te embora.- Sou realmente teu filho! Deixa-me trabalhar, sei arar tão bem ou melhor do que tu.- Não, não; tu não és meu filho e não sabes arar coisa nenhuma; vai-te embora.Mas, estando com medo daquele homenzarrão, largou o arado, afastou-se e foi sentar-se à margem do campo. Então o rapaz pegou no arado, segurou-o com uma só mão, mas tão fortemente que o mesmo afundou na terra. Vendo aquilo o camponês não se conteve e gritou:- Se de fato queres arar, não deves imprimir tanta força, pois só farias um trabalho mal feito.O rapaz, como resposta, desatrelou os cavalos e posse a puxar sozinho o arado, dizendo:- Podes voltar para casa, meu pai. Não te esqueças de dizer à minha mãe que prepara um belo caldeirão de comida para o jantar, enquanto isso acabarei de arar o campo.Voltando para casa, o camponês mandou a mulher preparar o jantar, enquanto o rapaz arava sozinho aquela grande extensão de terra; depois, pegou na grade e num breve lapso de tempo destorroou o campo. Uma vez terminado o trabalho, dirigiu-se a um bosque ali perto, arrancou dois carvalhos, colocou-os às costas, pondo por cima deles as grades, por cima das grades o arado, os cavalos e tudo o mais, e, como se estivesse carregando um feixe de palhas, levou tudo para casa.Quando chegou no quintal da casa, a mãe não o reconheceu e perguntou;- Quem é aquele homenzarrão espantoso?- Ê nosso filho, - respondeu o camponês.- Não, - disse ela, - não pode ser nosso filho. Jamais tivemos um filho tão grande; o nosso era um tiquinho.E gritou-lhe da janela:-Vai-te embora, não te queremos aqui.O rapaz não respondeu, levou os cavalos para a estrebaria, deu-lhes feno e aveia como era preciso, depois foi para a sala e sentando-se no banco disse:- Mãe, estou com fome, já está pronta a comida?A mãe trouxe para a mesa dois pratos enormes e tão cheios, que daria para alimentar o casal durante oito dias. Mas o rapaz devorou tudo sozinho num instante e ainda perguntou se não havia mais.- Não, isso é tudo o que temos.- Isso foi apenas a amostra, para mim é preciso muito mais.Com receio dele a mãe pês no fogo o caldeirão com que fazia comida para os porcos, cheio até transbordar, e, quando a comida ficou pronta, serviu-a.- Até que enfim chegam mais algumas migalhas! - disse o rapaz. E comeu tudo, mais ainda não era o suficiente para matar-lhe a fome. Então, disse:- Meu pai, bem vejo que na tua casa nunca conseguirei matar a fome; queres arranjar-me um cajado de ferro, bem forte, que eu não possa quebrá-lo sobre os joelhos? Depois ir-me-ei embora daqui.O camponês alegrou-se; atrelou os dois cavalos no carro e foi à casa do ferreiro buscar uma barra tão grande e grassa que os cavalos mal apenas podiam transportar. O rapaz pegou-a e, com o joelho, partiu-a pelo meio como se fora uma frágil bengala e atirou-a fora.Então o pai atrelou quatro cavalos no carro e foi buscar uma barra de ferro tão grossa que os quatro cavalos quase não podiam transportar. E, novamente, o filho partiu-a, com o joelho, em dois pedaços; jogando-a fora, disse:- Meu pai, isto é pouco; é preciso atrelar mais cavalos e ir buscar uma barra mais forte.O pai, então, atrelou oito cavalos e foi buscar uma barra tão grossa e forte que os oito cavalos quase não podiam transportar. Quando o filho pegou na mão essa barra, logo quebrou-lhe uma das pontas.- Vejo, meu pai que não consegues arranjar-me o cajado adequado, portanto não ficarei mais aqui.Foi-se embora, fazendo-se passar por um ajudante de ferreiro. Assim chegou a uma aldeia onde morava um ferreiro tremendamente avarento, que nunca dava nada a ninguém e tudo queria para si; o rapaz entrou na ferraria perguntando se não necessitavam de um bom ajudante. O ferreiro contemplou-o de alto abaixo, depois disse:- Sim, estou precisando de um, - e pensava consigo mesmo: "Este é um mocetão vigoroso, deve ser capaz de bater o malho com força e ganhar honestamente o pão!"- Quanto queres ganhar? - perguntou-lhe.- Não quero salário algum. - respondeu o moço; - quero somente que me permitas dar-te, em cada quinzena, quando pagas os outros empregados, dois pontapés para ver se aguentas.O avarento ficou bem satisfeito com a proposta, achando que economizaria um bom dinheiro.Na manhã seguinte, o novo ajudante foi encarregado de bater o malho, mas, quando o oficial-ferreiro manejou o ferro incandescente, o rapaz assestou-lhe tal golpe de malho que o reduziu a migalhas e, ainda por cima, enterrou a bigorna no chão, tão profundamente que nunca mais foi possível desenterrá-la. Terrivelmente zangado com isso, o ferreiro disse-lhe:- Olá, rapaz vejo que não podes servir; és muito desastrado e bates com demasiada violência. Quanto queres por aquele único golpe?O rapaz respondeu:- Quero apenas que me deixes dar-te um levíssimo pontapé, e nada mais.O homem concordou; então, levantando a perna, o rapaz assestou-lhe tamanho pontapé que o outro voou além de quatro carros de feno. Depois escolheu a barra mais forte que encontrou na oficina e, servindo-se dela como de um cajado, foi-se embora.Andou um pouco, sem direção certa, até que avistou uma granja; foi até lá e perguntou ao administrador se não estava precisando de um feitor.- Estou, sim - respondeu o outro; - tu me pareces forte e decidido, capaz de fazer bom trabalho. Quanto queres ganhar por ano?Ele respondeu que não queria salário algum; queria apenas que lhe permitisse dar-lhe três pontapés por ano, mas que os deveria aguentar.O administrador, que também era um grande avarento, aceitou a proposta. Na manha seguinte, os empregados deviam ir cortar lenha na floresta; já estavam todos levantados e prontos para partir, só o rapaz continuava ainda dormindo. Então, um deles gritou-lhe:- Ei, levanta, já está na hora, seu preguiçoso! Temos de ir rachar lenha na floresta e tu também tens que vir conosco.- Podem ir, - grunhiu impaciente o rapaz; - chegarei antes de todos.Não se conformando, os empregados foram ter com o administrador, queixando-se do feitor que ainda estava na cama e não queria ir com eles. O administrador mandou que o chamassem, novamente, para que fosse atrelar os cavalos; mas o dorminhoco repetiu:- Podeis ir adiante; sempre chegarei antes de todos.E continuou a dormir mais umas duas horas e depois levantou-se. Antes de ir trabalhar, ainda foi ao celeiro buscar dois alqueires de ervilha e com elas preparou um excelente mingau. Muito sossegadamente comeu o mingau e depois foi atrelar os cavalos e dirigiu-se para a floresta, mas, pura chegar lá, tinha de passar por um estreito desfiladeiro; fez passar primeiro o carroção, em seguida voltou atrás e arrancando algumas árvores fez com elas uma barricada que impedia a passagem de qualquer cavalo. Depois, foi indo e, quando chegou à floresta, os companheiros já vinham de volta com os carros carregados de lenha. O rapaz tornou a repetir:- Podeis ir; sempre chegarei antes.Não se deu ao trabalho de penetrar muito na floresta, arrancou algumas árvores como se fossem gravetos, por aí mesmo, carregou-as no carro e voltou. Ao chegar onde estava a barricada, os companheiros estavam lá sem poder passar, pois a barricada obstruia-lhes o caminho.- Estais vendo, - disse ele; - se tivésseis ficado comigo chegaríeis todos na mesma hora, com a vantagem de dormir um pouco mais.Foi tocando os cavalos, mas estes não conseguiram passar; então desceu do carro, desatrelou os cavalos, embarcando-os junto com a lenha, pegou nos varais e, com todo aquele peso, passou com a mesma facilidade como se estivesse puxando um carro de plumas. Transposto o obstáculo, voltou-se e disse aos outros:- Vistes? Passei mais depressa que todos.Continuou o caminho tranquilamente, enquanto que os companheiros ficaram lá parados resolvendo os próprios problemas. Entrando no terreiro da casa, o rapaz agarrou uma daquelas árvores enormes com uma só mão e, mostrando-a ao administrador, disse:- Não é uma boa tora?O administrador virou-se para a mulher, exclamando:- Esse camarada é bom mesmo! Embora durma mais do que os outros, ainda assim chega primeiro.O rapaz trabalhou na granja durante um ano, findo o qual o administrador distribuiu o salário aos outros empregados; - então o rapaz disse que chegara o momento de ajustar também as contas. Mas agora o administrador estava com medo de receber os pontapés convencionados e pediu-lhe, encarecidamente, que o perdoasse. A ter de receber os pontapés, preferia que o rapaz se tornasse administrador e ele simples feitor.- Não, - respondeu o moço, - não quero ser administrador; sou e continuarei sendo feitor, mas faço questão de executar o que foi combinado.O administrador propôs dar-lhe tudo o que ele quisesse, mas em vão. O rapaz não quis aceitar coisa alguma. O administrador, não sabendo para que santo apelar, pediu-lhe então que prorrogasse o pagamento por uns quinze dias, para ter tempo de refletir.O feitor consentiu. Então o administrador reuniu todos os escrivães para que o ajudassem a resolver a questão. Os escrivães meditaram, profundamente, e acabaram concluindo que, com esse feitor ali, ninguém tinha a vida segura, pois ele mataria qualquer pessoa como se fosse minúsculo mosquito. Aconselharam-no a que o mandasse limpar o poço e, quando ele estivesse no fundo fazendo a limpeza, eles aproveitariam para atirar-lhe na cabeça a mó que estava aí porto e assim o perigoso rapaz não voltaria nunca mais a ver a luz do sol!Tal conselho agradou ao administrador que mandou sem mais demora o rapaz limpar o poço, o qual obedeceu e entrou nele. Enquanto estava lá no fundo trabalhando, os outros rolaram depressa a grande mó deixando-a cair no poço, certos de lhe terem esmigalhado o crânio; mas ele gritou.- Enxotem as galinhas daí. Elas ficam ciscando perto do poço e me jogam areia nos olhos, cegando-me a vista.Então o administrador, vendo que as mós não faziam efeito, fingiu tocar as galinhas fazendo: xó, xó.Terminado o trabalho, o feitor saiu do poço, dizendo:- Olha que belo colar eu tenho!Era, simplesmente, a mó que tinha enfiada no pescoço.Já se esgotara o prazo determinado; então, o rapaz exigiu que fosse efetuado o pagamento, mas o administrador pediu outra prorrogação de quinze dias e convocou nova reunião dos escrivães para que o ajudassem; estes o aconselharam a que mandasse o feitor ao moinho enfeitiçado, durante a noite, para moer o grão, pois era sabido que quem passasse a noite lá não saia vivo.O administrador achou a ideia ótima e, nessa mesma tarde, deu ordens ao feitor para que levasse oito alqueires de grão ao moinho e o moesse durante a noite, alegando que tinha grande urgência disso.O feitor obedeceu. Foi ao celeiro, pôs dois alqueires de grão no bolso direito, dois no bolso esquerdo e os outro quatro numa sacola, pendendo metade nas costas e metade na frente; assim carregado foi para o moinho enfeitiçado.Lá, o moleiro contou-lhe que durante o dia podia moer à vontade, mas à noite era impossível, porque o moinho estava embruxado e quem nele entrasse de noite, de manhã seria encontrado morto. Mas o rapaz disse com otimismo:- Eu darei um jeito. Quanto a vós, podeis descansar as orelhas no travesseiro e dormir sossegadamente.Em seguida, entrou no moinho, despejou o grão na canoura e, por volta das onze horas, foi sentar-se no quarto ao lado. Depois de certo tempo que estava aí sentado tranquilamente, abriu-se inopinadamente a porta e por ela foi entrando uma grande mesa, enorme. Depois foi aparecendo sobre a mesa vinhos, assados e muitos outros petiscos deliciosos. As cadeiras achegaram-se sozinhas junto da mesa, mas não viu ninguém sentar-se e, de repente, viu uma porção de dedos manejando facas e garfos e servindo comida nos pratos, sem que aparecesse ninguém.O rapaz, que estava com uma fome de lobo, vendo toda aquela comida não hesitou, sentou-se junto da mesa e comeu com o maior apetite. Quando acabaram de comer e todos os pratos estavam vazios, apagaram-se as luzes, reinando a maior escuridão. Ouviu alguém chamando-o e, logo depois, recebeu uma forte bofetada em pleno rosto. Então protestou:- Se isto se repetir, eu também começarei a distribuir bofetadas a torto e a direito.A segunda bofetada não se fez esperar; então, ele posse a distribuir sopapos com u maior boa vontade do mundo, continuando assim a noite inteira. Não recebeu nenhuma grátis; todas que lhe chegavam recebiam o troco dobrado. E quando, finalmente, raiou o dia, cessou todo aquele pandemônio. Ao levantar-se da cama, o moleiro foi logo para o moinho, querendo saber que fim tinha levado o rapaz e, vendo-o ainda vivo e são, ficou tão espantado que quase caiu de costas.- Comi tanto e tão bem como nunca na minha vida, - disse-lhe o rapaz. - É verdade que levei uma boa dose de bofetadas, mas também as retribui com gosto.O moleiro não cabia em si de alegria, pois, com essa façanha, o moinho libertara-se do feitiço e desejou dar-lhe muito dinheiro para recompensá-lo de tudo. Mas o rapaz disse-lhe:- Não aceito dinheiro, já tenho suficiente.Em seguida, carregando os sacos de farinha nas costas, voltou para a granja e foi dizer ao administrador que, tendo executado as ordens, vinha cobrar o pagamento antes combinado.O pobre administrador, diante disso, quase morreu de susto. Completamente desatinado, andava de cá para lá na sala, o suor escorrendo-lhe do rosto. Sentiu necessidade de respirar um pouco de ar fresco e dirigiu-se à janela, abrindo-a de par em par; mas, quando menos o esperava, o feitor assestou-lhe tamanho pontapé que o atirou fora da janela, fazendo-o voar tão longe, tão longe que nunca mais o viram. Feito isto, o feitor disse à mulher do administrador:- Se ele não voltar, terás que receber em seu lugar o segundo pontapé.- Não, não, - gritou ela assustada; - eu não aguentaria.E aproximou-se da janela, porque o suor lhe banhava o rosto. Ele aproveitou a oportunidade e deu-lhe, com força, o segundo pontapé, fazendo-a voar pelos ares, e, sendo ela mais leve que o marido, foi para muito mais longe ainda.O marido gritou-lhe de onde estava:- Vem junto de mim!- Eu não posso, - gritou ela, - vem tu perto de mim!E assim, librando-se no espaço, lá ficaram sem poder um alcançar o outro.Se ainda estão lá, não sei; só sei que o jovem gigante pegou no cajado de ferro e continuou a correr mundo.Este episódio é-lhe oferecido por Podbean.com.
Wednesday Aug 14, 2024
Wednesday Aug 14, 2024
Houve, uma vez, uma velha rainha que enviuvara desde muito tempo, ficando apenas com uma filha de extrema beleza.A menina foi crescendo e se tornou uma belíssima jovem; então foi prometida em casamento ao filho do rei de um reino distante. Quando chegou a época de se realizarem as bodas, ela teve que partir para o reino do noivo. A rainha viúva deu-lhe um riquíssimo enxoval que, além de muita roupa maravilhosa, incluia também uma grande quantidade de móveis finamente cinzelados, jóias raras, cristais finíssimos e uma infinidade de objetos de ouro e prata; em suma, deu-lhe o máximo que convinha a uma princesa real, pois amava ternamente sua única filha. Para a longa viagem deu-lhe ainda uma aia, incumbida de acompanhá-la e entregá-la nas mãos dopríncipe. No momento de partir, as duas receberam um cavalo cada uma, sendo que o da princesa se chamava Falante, porque sabia falar.Na hora das despedidas, a rainha foi ao quarto; com uma faquinha de ouro feriu-se no dedo e deixou pingar três gôtas de sangue num alvo lencinho de rendas; em seguida, entregou o lenço à filha, recomendando-lhe:- Minha querida filha, guarda isto com o máximo cuidado; ser-te-á de grande auxílio na viagem.Abraçaram-se e beijaram-se com grande tristeza; depois de guardar o lenço no decote do vestido, a princesa montou a cavalo e partiu. Após algumas horas de viagem, ela teve sêde e pediu à aia:- Apeia e vai buscar, com o copo que trouxeste para mim, um pouco de água daquele regato; estou com muita sêde.- Se tendes sêde, - respondeu a aia rispidamente - descei do cavalo e ide beber no regato, pois não me agrada ser vossa criada.Como estivesse realmente com muita sêde, a princesa apeou, foi até ao regato e bebeu; não tendo tido a coragem de pedir o copo de ouro bebeu nas mãos, suspirando: "Ai meu Deus!"As três gôtas de sangue do lencinho, disseram:- Ah, se tua mãe o soubesse, o coração dela se partiría de dor!A princesa, porém, não disse nada; voltou humildemente a montar o cavalo e a viagem continuou. Cavalgaram muitas milhas. O dia estava quente e o sol abrasador; a princesa tornou a sentir sêde e, ao chegar perto de outro regato, já esquecida da grosseria da aia, pediu- -lhe outra vez que lhe fósse buscar um copo de água.Mas a aia respondeu com desdém:- Quereis beber? então apeai e ide beber. De hoje em diante proíbo-vos de me considerar vossa criada.A princesa desmontou do cavalo, debruçou-se junto do regato e bebeu pelas mãos em concha, suspirando: "Ai meu Deus!"E as três gotas de sangue responderam:- Ah, se tua mãe o soubesse, o coração dela se partiría de dor!Estando ela assim debruçada sôbre o regato, o lenço caiu dentro da água e foi levado pela correnteza abaixo. Porém, como ela estivesse tão aflita e preocupada, não deu por isso. Mas a aia bem que viu e exultou; pois daí em diante a noiva estava sem seu poder. Tendo perdido aquelas preciosas gôtas de sangue, tornara-se sem forças e incapaz de qualquer autoridade. Quando a princesa fêz menção de montar o cavalo, a aia antecipou-se-lhe, dizendo com altivez:- Não, não. Falante agora me pertence; tu ficarás com o meu sendeiro.A pobre princesa teve de submeter-se. A aia ordenou-lhe ainda que despisse os ricos trajes reais e os substituísse pelos seus rústicos vestidos de simples criada, fazendo-a jurar, sob pena de morte, que do ocorrido não contaria nada a ninguém na côrte de seu noivo.Falante, porém, tudo vinha observando com grande atenção.Depois disso, a aia montou no cavalo Falante e a noiva legítima no velho sendeiro; e assim fizeram o resto da viagem.Ao chegarem ao castelo real, foram recebidas com grandes manifestações de alegria; o noivo saiu-lhes ao encontro e ajudou a aia a descer do cavalo, certo de que fôsse a sua noiva. Acompanhada de luzido cortejo ela foi introduzida no paço, enquanto a verdadeira princesa ficava lá fora no pátio.Mas o velho rei, pai do noivo, que estava à janela, viu a delicada e mimosa jovem parada no meio do pátio completamente esquecida. Impressionado pela sua graça e beleza, foi perguntar à falsa noiva quem era aquela criatura que trouxera consigo e deixara lá fora.- Oh, - disse a noiva - é uma pobre môça que apanhei na estrada para me fazer companhia. E' bom dar- -lhe alguma ocupação para que não fique por aí vagabundando.O rei não sabia que serviço lhe podia dar; finalmente, depois de pensar um pouco, teve uma idéia.- Tenho um rapazinho que pastoreia os meus gansos; ela poder ia ajudá-lo!Assim a pobre princesa foi pastorear gansos junto com o rapazinho, que se chamava Conrado.Alguns dias depois a embusteira disse ao noivo:- Meu querido noivo, desejo pedir-vos um favor todo especial.- Sereis atendida com o maior prazer, - respondeu o príncipe.- Desejo que mandeis cortar a cabeça do cavalo em que vim montada, pois deu-me muitos aborrecimentos pelo caminho.Na verdade, porém, ela estava com mêdo de que o cavalo revelasse os maus tratos que dispensara à princesa. As coisas estavam num tal pé que não foi possível ao príncipe deixar de atendê-la e o bom cavalo Falante teve de morrer.A novidade espalhou-se e, ao ter conhecimento dela, a princesinha desmaiou. Então chamou, em segrêdo, o magarefe que matara o cavalo e, cautelosamente, prometeu que lhe daria umas moedas de ouro se lhe prestasse um pequeno favor. Havia na cidade um portão com um grande arco de pedra, escuro, sob o qual ela tinha que passar, diàriamente, com os gansos. Queria que o homem pregasse a cabeça do cavalo nesse arco a fim de ela ter a consolação de ver ainda algumas vêzes o querido corcel.Na manhã seguinte, muito cedo, a princesa e Conra- do, tocando os gansos, passaram sob o arco de pedra e ela exclamou tristemente:- Ó Falante, que aí estás pregado!e a cabeça respondeu:
- Ó pequena Rainha que cuidasdos gansos de teu senhor;se tua mãe o soubesse,o coração dela se partiria de dor!
Ela continuou, silenciosamente, o caminho para fora das muralhas da cidade, rumo ao campo onde os gansos iam pastar. Chegando a um belo relvado, a princesa sen- tou-se e soltou a maravilhosa cabeleira de ouro. Conra-do ficou tão deslumbrado com o brilho dos cabelos dela que desejou arrancar alguns. A princesa, então, cantarolou:
- Sopra, sopra forte, amigo vento!Carrega para além dêste pradoo chapèuzinho de Conrado,e não permitas que êle o alcanceantes de pronto o meu penteado!
No mesmo instante, levantou-se um forte vento que levou para longe o chapèuzinho de Conrado, obrigando o pobre rapazinho a correr-lhe atrás pelo campo afora.Quando, finalmente, voltou com o chapèuzinho, ela já tinha penteado os cabelos e prendido sob a touca, de modo que êle não conseguiu furtar nem um fio dos cobiçados cachos.Então Conrado ficou muito zangado e não quis mais falar com ela; assim guardaram os gansos, em silêncio, até ao cair da noite; depois regressaram ao castelo.Na manhã seguinte, tornando a passar sob o arco de pedra, a princesa suspirou a repetiu as palavras da véspera:- Ó Falante, que aí estás pregado!Falante respondeu:
- Ó pequena Rainha, que cuidasdos gansos de leu senhor;se tua mie o soubesse,o coração dela se partiria de dor!No campo, ela sentou-se outra vez no relvado e pôs- se a pentear a magnífica cabeleira de ouro. O rapazinho correu para ela no intuito de roubar-lhe um cacho; mas ela, mais que depressa, repetiu o verso:
- Sopra, sopra forte amigo vento!Carrega para além dêste pradoo chapèuzinho de Conrado.e não permitas que êle o alcanceantes de pronto o meu penteado!
O vento soprou com fôrça e carregou para longe o chapèuzinho de Conrado, que foi obrigado a correr para apanhá-lo. Quando voltou, a princesa já estava penteada e com a touca na cabeça; assim, nem desta vez pôd' o rapazinho satisfazer o desejo de arrancar-lhe alguns fios de cabelo. Ficou muito zangado e deixou de falar com ela durante o resto do dia. Mas à noite, assim que chegaram ao castelo, Conrado foi ter com o rei, declarando:- Não quero mais pastorear os gansos junto com essa môça.- Por quê? - indagou o velho rei.- Porque ela me aborrece o tempo todo!O rei, então, exigiu que êle contasse direito o que se passava.- Ora, tôdas as manhãs, - disse Conrado - quando passamos com os gansos sob o arco de pedra, ela fala com a cabeça de cavalo lá pendurada, dizendo:- ó Falante, que aí estás pregado!e a cabeça lhe responde:- Ó pequena Rainha, que cuidasdos gansos de teu senhor;se tua mãe o soubesse,o coração dela se partiria de dor!
Depois contou a história do vento que lhe arrancava o chapéu da cabeça e êle tinha que correr por todo o campo a fim de apanhá-lo.O rei mandou que fôssem, ainda no dia seguinte, levar os gansos ao prado; e, muito cedo, foi postar-se atrás do arco e ouviu a môça que falava à cabeça do cavalo. Depois seguiu-a, ocultamente, até ao prado e se escondeu atrás de uma moita. Com os próprios olhos viu a pastorinha sentar na relva e soltar a maravilhosa cabeleira que cintilava como ouro puro. E viu o rapaz aproximar-se e ela dizer depressa:
- Sopra, sopra forte amigo vento!Carrega para além dêste pradoo chapèuzinho de Conrado,e não permitas que êle o alcanceantes de pronto o meu penteado!
Mal a pastorinha acabou de dizer o verso uma forte lufada de vento carregou para longe o chapéu de Conrado, que saiu a correr para apanhá-lo. Enquanto isso, a môça penteou tranqüilamente os formosos cachos de ouro; e o rei tudo observava com grande atenção.Sem que fôsse notado, o rei voltou para o castelo e, à noite, quando a pastorinha regressou, chamou-a para um canto e perguntou-lhe o que significava tudo aquilo.- Não posso contar, Majestade, nem posso revelar a ninguém a minha mágoa; jurei à luz do sol nunca dizer nada a ninguém; se quebrar meu juramento, perderei a vida.O rei insistiu com firmeza, mas não conseguiu arrancar-lhe mais uma só palavra. Então lhe disse:- Pois bem, já que não queres contar a mim o teu segrêdo, confia-o ao fogo da lareira.Dito isto, virou-lhe as costas e foi-se embora.Ficando sozinha, a môça debruçou-se sôbre o fogo chorando e lamentando-se amargamente; desabafou sua grande mágoa, dizendo:- Eis-me aqui só e abandonada de todos! No entanto, sou uma princesa. Ao passo que uma perversa aia, que me forçou a trocar meus vestidos reais pelos dela, está usurpando meu lugar junto ao príncipe, meu noivo. E eu sou obrigada a pastorear gansos no prado e fazer os trabalhos mais grosseiros. Oh, se minha mãe o soubesse, o coração dela se partiría de dor!O rei, que fingira afastar-se, estava postado atrás da lareira e ouviu tôda a confissão da pobre môça. Voltou para o salão e mandou a pastorinha sair de junto a lareira. Depois deu ordens às camareiras para que a vestissem e ataviassem como convinha a uma verdadeira princesa. Ela ficou tão linda que parecia um sonho.Chamando o filho, o rei pô-lo ao par de tudo, revelando que ficara com a falsa noiva, uma simples aia. enquanto a verdadeira noiva ia pastorear gansos no prado.O príncipe ficou deslumbrdo ante a beleza e encanto da môça; mandou logo preparar um suntuoso banquete para festejar o encontro e convidar todos os amigos e parentes. O noivo sentou-se à cabeceira da mesa, tendo a princesa de um lado e a aia do outro; esta última estava tão deslumbrada com a magnificência da princesa que não a reconheceu naqueles trajes fulgurantes.Quando terminaram de comer e beber e os convivas estavam no auge da animação, o velho rei contou à aia, com grande habilidade, uma história bem semelhante à dela e perguntou:- Que castigo achas que merece uma pessoa que assim trai o seu amo?A falsa noiva, sem desconfiar de nada, respondeu:- Acho que uma pessoa assim deveria ser desnudada e colocada dentro de um barril todo forrado de pontas de pregos, ao qual deveríam atrelar dois fogosos cavalos que o arrastassem pelas ruas da cidade até ela morrer.- Essa criada perversa és tu, - disse o rei - e acabas de proferir a tua própria condenação; assim será feito.A sentença foi logo cumprida. Depois, o príncipe casou com a verdadeira princesa e ambos reinaram durante longos anos na mais completa felicidade.Este episódio é-lhe oferecido por Podbean.com.
Wednesday Aug 14, 2024
Wednesday Aug 14, 2024
Houve, uma vez, um homem que devia fazer uma longa viagem; despedindo-se de suas três filhas, perguntou-lhes o que queriam que lhes trouxesse. A mais velha pediu que lhe trouxesse lindas pérolas, a segunda pediu grandes diamantes e a terceira disse apenas:- Meu pai, eu quero uma andorinha que canta e pula.O pai sorriu e respondeu:- Está bem; sé conseguir achá-la farei por trazê-la.Depois beijou as três moças e partiu.Chegando o momento de regressar a casa, levava consigo as pérolas e os diamantes para as duas mais velhas, mas a tal andorinha, que cantava e pulava, para a mais moça, não lhe foi possível descobrir em parte alguma; isso o aborrecia porque queria satisfazer a vontade da filha que era a sua predileta.O caminho que percorria devia passar por uma floresta, no meio da qual havia um suntuoso castelo e perto do castelo uma frondosa árvore. Nos galhos mais altos dessa árvore, ele viu uma andorinha cantando e pulando.- Ah chegas em boa hora! - exclamou ele muito contente.Chamou o criado e mandou que trepasse na árvore e apanhasse a andorinha; quando este se aproximava da árvore, eis que pulou para fora um leão; sacudiu a juba e rugiu a ponto de fazer estremecer as copadas das árvores.- Se alguém tentar roubar-me a andorinha que canta e pula, devoro-o - gritou ele.- Perdão, - disse o homem - eu não sabia que o pássaro te pertence. Quero reparar meu erro e pagar-te com ouro maciço o resgate pela minha vida.O leão respondeu, desdenhoso:- Nada poderá salvar-te se não prometeres formalmente entregar-me a primeira coisa que te vier ao encontro quando chegares em casa. Se mó prometeres, dar-te- ei esse pássaro e, também, a vida.O homem recusou esta proposta, dizendo:- Essa primeira coisa bem poderia ser minha filha menor, que me tem mais amor do que as outras; essa é quem sempre corre ao meu encontro quando volto para casa.O criado, porém, que estava meio morto de medo, disse:- Tendes certeza de que será mesmo vossa filha quem virá ao vosso encontro? Poderia ser um gato um cão!O homem acabou por se persuadir; pegou a andorinha que cantava e pulava, prometeu ao leão tudo o que ele queria e pôs-se a caminho de casa. Quando ia entrando, a primeira coisa que viu foi a filha, a mais nova e a predileta, que correu ao seu encontro abraçando-o e beijando-o muito feliz; quando viu que o pai trazia a andorinha que canta e pula, não coube em si pela alegria. Mas o pai não podia sentir alegria ao lembrar-se da promessa feita e, chorando tristemente, disse-lhe:- Minha querida filhinha, esse pássaro custou-me muito caro; fui obrigado a prometer ao leão feroz que te daria a ele em troca disso. Ah, se fores ter com ele, serás estraçalhada e devorada num minuto!Contou-lhe, pormenorizadamente, tudo o que havia acontecido, acrescentando que ela não devia ser sacrificada em cumprimento de tal promessa. A moça, porém, confortou-o como pôde, dizendo:- Meu querido pai, o que prometeste é preciso que se cumpra; portanto, irei e farei tudo para amansar o leão e depois voltar, novamente, para casa sã e salva.Na manhã seguinte, pediu que lhe indicassem o caminho; despediu-se de todos e penetrou, corajosamente, na floresta.O feroz animal, porém, era simplesmente um príncipe encantado; durante o dia, assumia o aspecto de leão feroz c, igualmente, se transformavam em leões todos os seus servidores, mas, à noite, retomava o aspecto humano. A sua chegada, ela foi recebida com muita cortesia e introduzida no castelo. Quando chegou a noite, o leão voltou a ser o belo príncipe e, não tardou muito, o dois casaram-se, realizando uma festa magnificente.Viviam eles completamente felizes, embora tivessem que dormir de dia e passar juntos a noite, acordados, com toda a sua corte. Decorrido algum tempo, o marido disse:- Vai haver festa amanhã em casa de teu pai, será celebrado o casamento de tua irmã mais velha. Se quiseres ir, poderei mandar meus leões acompanhar-te.Ela aceitou, pois estava morrendo de saudade do pai. Assim, no dia seguinte, foi para lá acompanhada pelos leões. À sua chegada, todos ficaram muito contentes e felizes, pois a supunham devorada pelo leão há muito tempo. Ela, porém, contou-lhes que belo marido possuía e como vivia feliz. Passou com eles todo o tempo que durou a festa de bodas e, depois, regressou ao seu palácio na floresta.Não demorou muito e a segunda irmã também se casou e a moça foi convidada para os festejos. Ela disse ao leão:- Desta vez, não quero ir só, tens que me acompanhar.O leão explicou-lhe que era muito perigoso para ele. porque, se o mais tênue raio de luz o tocasse, ele se transformaria numa pomba c seria obrigado a andar durante sete anos com outras pombas.- Ora, - disse ela, - eu te protegerei e tudo farei para preservar-te da luz; vem comigo!O leão então decidiu ir e foram, levando consigo o seu filhinho. A moça mandou preparar uma sala com paredes tão herméticas que não permitissem a passagem do menor raio do luz, para que o leão se instalasse quando acendessem os archotes nupciais. Mas, sendo a porta desta sala de madeira ainda verde, abriu-se nela uma frestazinha imperceptível.O casamento foi realizado com a máxima pompa, e, quando o cortejo regressou da igreja e passou diante da porta com suas velas e archotes acesos, um tênue fio de luz penetrou pela fresta e incidiu sobre o príncipe que, instantaneamente, se transformou em pomba; quando a moça foi ter com o marido, viu apenas uma pomba branca em seu lugar, a qual lhe disse com tristeza:- Agora terei que voar pelo mundo afora durante sete anos; mas, a cada sete passos, deixarei cair uma gota de sangue e uma pena branca; isso te indicará meu caminho. Se o seguires, ainda poderás libertar-me.Dito isto, saiu voando pela porta e ela o foi seguindo. A cada sete passos, caía no chão uma gota de sangue e uma pena branca pelas quais ela se orientava. Assim foi andando, sempre mais longe, pelo vasto mundo afora, sem nunca olhar para lado algum e sem nunca descansar. Quando já estavam quase para findar os sete anos. ela ficou feliz, pensando que a libertação não estava longe. Mas, infelizmente, estava ainda bem distante!Certo dia, porém não viu cair nem uma gota de sangue e nem uma pena e, erguendo os olhos para o alto, viu que a pomba havia desaparecido. "Os homens não te poderão ajudar," pensou ela. Então decidiu-se e foi ter com o Sol, perguntando-lhe:- Tu, que brilhas desde os mais altos picos até às mais obscuras fendas, não viste passar voando uma pomba branca?- Não, não vi; - respondeu o Sol - mas vou dar- te uma caixinha, que abrirás quando estiveres em grande dificuldade.A moça agradeceu, cordialmente, e continuou andando, até que se fez noite e surgiu a Lua; ela foi e perguntou-lhe:- Tu, que resplandeces à noite inteira sobre os campos e florestas, não viste por acaso uma pomba branca voando?- Não, não vi; - disse a Lua, - mas vou dar-te um ovo. Quando estiveres em dificuldades, quebra-o, que ele te ajudará.A moça agradeceu de coração à Lua e continuou andando até que se levantou o Vento da Noite soprando nela; dirigiu-se a ele:- Tu, que sopras por entre as árvores, não viste por acaso uma pomba branca voando?- Não, não vi; - respondeu o vento - mas vou perguntar aos outros ventos, talvez a tenham visto.Chegaram os ventos do Oriente e do Ocidente, que também não tinham visto nada; mas, chegando o vento do Sul, esse disse:- Eu vi a pomba branca; foi voando para o mar Vermelho e lá se transformara outra vez em leão. Os sete anos já passaram, por isso o leão está combatendo com um dragão, o qual, na verdade, nada mais é do que uma princesa encantada.Então o Vento da Noite disse à moça:- Vou dar-te um conselho: vai até ao mar Vermelho; na margem direita, encontrarás muitas varas grossas; conta-as, depois corta a undécima e com ela bate no dragão; assim o leão poderá vencê-lo e os dois readquirirão aspecto humano. Em seguida, olha à tua volta e verás um Condor, que habita nas margens do mar Vermelho; senta-te com teu marido nas suas costas e o Condor vos reconduzirá de volta para casa, do outro lado do mar. Aqui tens uma noz; quando chegares ao meio do mar, deixa-a cair na água; ela brotará imediatamente, tornando-se uma grande nogueira, sobre o qual o Condor descansará do seu voo, pois, se não tivesse onde descansar, não teria forças suficientes para levar-vos até a margem oposta. Presta atenção: se esqueceres de jogar a noz dentro do mar, o Condor vos deixará cair na água.A moça obedeceu, exatamente, o conselho do Vento da Noite. Chegou onde estavam as varas, cortou a undécima, com ela bateu no dragão e assim o leão conseguiu vencer. Imediatamente, os dois se transformaram em seres humanos. Mas, assim que a princesa, que antes fora dragão, foi libertada do encanto, pegou no braço do príncipe e ambos sentaram nas costas do Condor, que os levou embora. A infeliz peregrina ficou lá abandonada; então sentou-se numa pedra e chorou longamente. Por fim reanimou-se um pouco e decidiu:- Irei tão longe até onde chega o vento e até que cante o galo; lá tornarei a encontrar meu amado.Pôs-se a caminho e andou, andou, andou, até chegar ao castelo onde os dois estavam morando e soube que se aprestavam a realizar as festas para o casamento deles. A moça, porém, disse:- Deus não me abandonará, estou certa!Então abriu a caixinha que lhe fora dada pelo Sol e viu dentro um vestido que resplandecei-a justamente como ele. Ela vestiu-o e dirigiu-se pura o castelo; lá, todos, ate mesmo a noiva, olhavam para ela mudos de admiração. O vestido agradou tanto à noiva que esta quis possui-lo para o vestir na hora do casamento e foi perguntar à moça se o vendia.- Não o darei por dinheiro, nem por outros bons, - respondeu a moça - mas, se o quiseres, terás de pagado com carne e sangue.A noiva perguntou o que queria dizer com isso; então a moça disse-lhe:- Quero que me deixes dormir uma noite nos aposentos do príncipe.A noiva relutou, mas como desejava loucamente o vestido, concordou; ordenou ao escudeiro do príncipe que lhe desse, ao deitar um copo de vinho, dentro do qual havia um narcótico. Depois, quando o príncipe adormeceu, levaram a moça aos aposentos dele. Ela sentou-se ao pé da cama, dizendo:- Eu te segui durante sete anos, fui ter com o Sol. com a Lua e com os quatros Ventos, para saber onde estavas; depois te ajudei a vencer o Dragão. Queres mesmo esquecer-me completamente?O príncipe, porém, dormia tão profundamente, que aquilo lhe parecia o sussurrar do vento entre os pinheiros. Ao raiar do dia, a moça foi levada para fora e obrigada a entregar o lindo vestido de ouro.Não tendo sido feliz nessa primeira tentativa, ela foi, desolada, sentar-se num prado e se pôs a chorar. Estava assim mergulhada em tristeza quando se lembrou do ovo que lhe dera a Lua; quebrou-o, e do seu interior saíram uma choca e doze pintainhos, todos de ouro, que se puseram a correr de um lado para outro, bicando o que encontravam e, depois, voltaram a aninhar-se sob as asas maternas, não existindo no mundo coisa mais linda de se ver.A moça levantou-se e os foi tocando para a frente; nisso a noiva saiu à janela e viu os maravilhosos pintainhos; ficou doida por eles e perguntou se não estavam à venda:- Não os venderei por dinheiro e nem por todos bens, mas se os quiseres terás de pagá-los com carne e sangue; - respondeu a moça. - Deixa-me dormir mais uma noite nos aposentos do príncipe.A noiva concordou, pensando que faria o mesmo da noite anterior. Mas, quando o príncipe se recolheu aos seus aposentos, perguntou ao escudeiro o que era aquele murmúrio e aquele sussurro que ouvia de noite. Então o escudeiro contou-lhe tudo: que ele havia dormido tão profundamente graças a um narcótico servido pela noiva, porque uma pobre moça lhe pedira para dormir aí em seu quarto. E disse que, também, nessa noite estava incumbido de dar-lhe o narcótico. O príncipe então ordenou:- Põe fora, aí no chão, o narcótico.E à noite, a moça foi novamente conduzida aos aposentos do príncipe. Mas, quando começou a lamentar-se e a contar suas tristes desventuras, o príncipe logo a reconheceu pela voz e pulou da cama, exclamando:- Agora sim é que estou desencantado. Eu tinha a impressão de estar vivendo num sonho; a princesa estrangeira me encantou para que eu te esquecesse. Felizmente Deus me livrou, em tempo, desse cruel engano e da estranha fascinação.Fugiram, ocultamente, do castelo durante a noite, pois temiam a cólera do pai da princesa, que também era feiticeiro. Em seguida, treparam nas costas do Condor e este os transportou para além do mar Vermelho. No meio do mar, a moça deixou cair a noz, que produziu uma grande nogueira. O Condor descansou, um pouco, sobre os seus galhos e depois os levou para casa, onde encontraram o filho que tinha crescido bastante e se tomara um belíssimo jovem.Dai em diante, não tiveram mais aborrecimentos e viveram alegres e felizes até o fim da vida.Este episódio é-lhe oferecido por Podbean.com.
Wednesday Aug 14, 2024
Wednesday Aug 14, 2024
Em tempos muito remotos, quando o bom Deus ainda andava pela terra entre os homens, certa tarde, após ter caminhado muito, sentiu-se cansado e a noite o surpreendeu antes que pudesse encontrar uma estalagem. Nisso, viu lá ao longe, na estrada, duas casas: uma grande e luxuosa, outra pequena e de aspecto mesquinho; uma se defrontava com a outra de cada lado da rua. Nosso Senhor, então, pensou: "Vou pernoitar na casa do rico, pois a ele não serei um peso."Dirigiu-se, pois, para a casa luxuosa e bateu na porta. O rico saiu à janela e perguntou ao viandante o que desejava. Nosso Senhor respondeu:- Venho pedir-vos pousada para esta noite.O rico olhou de alto abaixo o viandante e, como o bom Deus vestia-se com a máxima modéstia e não tinha aspecto de alguém com os bolsos recheados, julgou-o um mendigo; sacudiu a cabeça, dizendo com altivez:- Não posso hospedar-vos; meus aposentos estão cheios de ervas e sementes até o teto; além disso, se tivesse de alojar todos os que vêm bater à minha porta, eu acabaria por ter de pegar num cajado e sair a mendigar. Ide procurar abrigo em outro lugar.Assim dizendo, bateu a janela, deixando o bom Deus no meio da rua. Então, Nosso Senhor virou-lhe as costas e dirigiu-se à casinha modesta da frente. Bateu, de leve na porta e, imediatamente, surgiu o pobre na janelinha; depois, correu a abrir a porta, convidando o cansado viandante:- Ficai aqui comigo esta noite, - disse ele amavelmente, - já está muito escuro e não vos convém continuar o caminho.Tal acolhida agradou, visivelmente, o bom Deus, que entrou na casinha. A mulher do pobre deu-lhe a mão, saudando-o gentilmente:- Sede bem-vindo a esta casa, - disse-lhe, - que estivesse à vontade; infelizmente, não temos muito a oferecer, mas o pouco que temos oferecemos de todo o coração.Foi, depressa, botar algumas batatas a cozer e, enquanto cozinhavam, ordenhou a cabra a fim de poder oferecer, também, um pouco de leite. Posta a mesa, Nosso Senhor sentou-se e comeu com eles, achando deliciosa aquela humilde refeição, porque tinha ao seu lado rostos alegres e felizes.Após o jantar, na hora de dormir, a mulher chamou o marido para um canto dizendo-lhe:- Ouve, meu caro; esta noite iremos dormir no palheiro para que o pobre viandante possa deitar-se em nossa cama e repousar tranquilamente; andou o dia todo, deve estar bem cansado!- Com o maior prazer, - disse o marido; - vou oferecer-lhe nossa cama.Dirigiu-se ao bom Deus pedindo-lhe que dormisse na cama do casal, desejando que repousasse bem. Nosso Senhor não queria privar o casal da cama, mas ambos insistiram tanto que, por fim, ele aceitou e deitou-se; o casal arrumou um pouco de palha no chão e aí repousou.No dia seguinte, levantaram-se de madrugada e prepararam o pequeno almoço para o hóspede, da maneira melhor possível. Quando o sol brilhou, dardejando raios através da janela, Nosso Senhor levantou-se, tomou a refeição matinal com eles e preparou-se a seguir caminho. Na soleira da porta, voltou-se para eles, dizendo:- Como sois tão bondosos e caridosos, desejai três coisas e eu vô-las concederei.O pobre disse, humildemente:- O que mais posso desejar se não a salvação eterna e que nós ambos, enquanto vivermos, tenhamos saúde e possamos ter sempre o pão de cada dia? Quanto à terceira coisa, realmente, não saberia o que desejar!O bom Deus, então, disse:- Não desejas trocar esta casa velha por uma nova?- Oh, sim, - respondeu o pobre, - se isto fosse possível, ficaria bem contente.Então, Nosso Senhor realizou aqueles três desejos; transformou a casa velha em outra completamente nova, abençoou-os de novo e partiu.O sol já ia alto, quando o rico levantou-se da cama. Saiu à janela e viu do outro lado da rua, exatamente onde antes havia a feia choupana, uma linda casa nova, toda garrida com o telhado vermelho. Arregalou os olhos, chamou sua mulher e perguntou:- Dize-me cá, que foi que aconteceu? Ontem, à noite, ainda estava ali a velha e mísera choupana e hoje vejo uma linda casa nova. Vai lá depressa, informa-te como se deu isso.A mulher foi à casa do pobre e tanto especulou que o homem acabou contando:- Ontem, à noite, chegou aqui um viandante pedindo abrigo até hoje; e pela manhã, ao despedir-se, fez questão de presentear-nos com três coisas: a salvação eterna da nossa alma; boa saúde durante a nossa vida e o pão de cada dia, e, finalmente, deu-nos também esta bela casa em troca da velha.A mulher do homem rico voltou correndo para casa e contou tudo ao marido. Este disse:- Eu deveria me enforcar! Ah, se o tivesse adivinhado! Esse viandante veio primeiro bater aqui, querendo pernoitar em nossa casa e eu, tolo, mandei-o embora.- Depressa, anda, - disse a mulher, - monta a cavalo e talvez ainda o alcances. Se o alcançares, deves pedir-lhe tu, também, três coisas.O rico seguiu o conselho, que achou ótimo; partiu a galope no cavalo e conseguiu alcançar o bom Deus. Falou-lhe com a maior amabilidade e cortesia, pedindo-lhe que não levasse a mai se não o havia recebido na noite anterior; procurara a chave da porta e nisso ele se íôra à outra casa. Agora, pedia-lhe que, ao tornar a passar por aí, se hospedasse em sua casa.- Sim, - respondeu o bom Deus, - se voltar, aceitarei de bom grado o vosso convite.Então, o rico perguntou se não poderia ele, também, exprimir três desejos, como fizera seu vizinho.- Podeis, sim, - disse Nosso Senhor, - mas não acho conveniente; e bem melhor não me pedir nada.O rico retrucou que, de qualquer maneira, pediria alguma coisa que só lhe favorecesse a felicidade, desde que tivesse a certeza de ser atendido.Então, o bom Deus lhe disse:- Volta para casa; os três desejos que formulares serão realizados.Tendo obtido o que desejava, o rico encaminhou-se de regresso à casa e ia refletindo no que devia desejar. Enquanto ia assim perdido em reflexões, deixou cair as rédeas e o cavalo pôs-se a pinotear, perturbando-lhe as ideias, de maneira que as não podia coordenar. Deu umas palmadinhas no pescoço do cavalo, dizendo:- Quieta, Lisa, quieta!Mas o cavalo empinou-se, levantando as patas dianteiras para o alto. O homem, então, irritou-se e gritou num assomo de impaciência:- Minha vontade é que quebres o pescoço!Nem mal acabou de o dizer, o cavalo caiu pesadamente ao chão; estava morto e bem morto. Assim, realizara-se o primeiro desejo. Mas, sendo o homem extremamente avarento por natureza, não quis largar aí os arreios; tirando-os do cavalo, colocou-os às costas e foi andando a pé. "Restam-te ainda dois desejos a formular," cogitava ele a título de consolação. Assim, caminhando lentamente pela poeira da estrada com o sol abrasador do meio-dia, ficou acalorado e de mau humor; a sela pesava-lhe nas costas e ainda não lhe ocorrera qual seria o segundo desejo. "Mesmo que eu deseje todos os reinos e todos os tesouros da terra, - pensava ele, - sempre me faltará alguma coisa, isto ou aquilo, já sei de antemão; quero agir de maneira que nada mais tenha a desejar neste mundo." Deu um grande suspiro e disse:- Ah, se eu fosse aquele camponês da Baviera que também dispunha de três desejos! Esse fulano soube ajeitar as coisas; primeiro desejou muita cerveja, depois tanta cerveja quanta pudesse beber e, finalmente, ainda um tonel de cerveja.Em dados momentos, parecia-lhe ter encontrado o que queria, mas logo achava que era pouco. Nisso, ocorreu-lhe que a mulher, em casa, estava feliz e tranquila, sentada numa sala fresquinha, comendo com o melhor apetite. Tal lembrança o encheu de despeito e, irrefletidamente, disse:- Bem gostaria de vê-la sentada nesta sela, sem poder descer, ao invés de estar eu aqui carregando este peso às costas!Nem bem lhe saíra da boca a última palavra e a sela desapareceu-lhe das costas; ele percebeu que também o segundo desejo se realizara. Então, sentiu ainda mais calor e deitou a correr, pensando em recolher-se ao quarto, muito só, e lá cogitar algo bem grande para o seu terceiro desejo. Mas quando chegou em casa e abriu a porta, viu, no centro da sala, a mulher encarapitada sobre a sela, sem poder descer, a chorar e a gritar assustada.Então, ele lhe disse:- Acalma-te! Contanto que fiques aí sentada quietinha, pedirei para ti todos os tesouros do mundo.Ela, porém, chamou-o de idiota, acrescentando:- De que me servem todos os tesouros do mundo se fico grudada nesta sela? Desejaste que eu ficasse aqui; agora tens de me ajudar a sair.Quisesse-o ou não, ele teve que exprimir o terceiro desejo; isto é, que a mulher pudesse descer e libertar-se da sela; o desejo foi imediatamente realizado.Assim, de toda aquela história ele nada mais lucrou que aborrecimentos, canseira, injúrias e ainda, por cima, um cavalo perdido. O casal de pobres, porém, viveu feliz e sossegado em plena piedade até o bem-aventurado fim, quando já eram muito, muito velhos.Este episódio é-lhe oferecido por Podbean.com.
Wednesday Aug 14, 2024
Wednesday Aug 14, 2024
Certa vez, a raposa surgiu num prado onde pastava tranquilamente um bando de gansos belos e gordos; vendo-os todos reunidos, ela pôs-se a rir, dizendo: - Chega bem a propósito! Estais todos aqui tão juntinhos que posso devorar-vos um após o outro facilmente.Muito assustados com aquilo, os gansos começaram um berreiro infernal, pulando de um lado para outro, lamentando-se e implorando que lhes poupasse a vida. Mas a raposa não queria saber de nada e disse:- Não há apelação nem misericórdia; tendes de morrer todos.Por fim, um deles criou coragem e propôs:- Se nós, pobres gansos, temos mesmo de perder nossas jovens existências, concede-nos pelo menos uma última graça: permite que rezemos as preces a fim de não morrer em pecado; depois nos colocaremos em fila para que não escolhas somente os mais gordos.- Está bem, - disse a raposa, - acho muito justo o pedido; vosso desejo é muito piedoso, podeis rezar. Eu ficarei esperando.Então o primeiro da fila iniciou uma prece bem longa que repetia sem cessar:- Quá, quá, quá!E como não parasse, o segundo ganso não esperou a vez e por seu turno começou:- Quá, quá, quá, quá!Imitando o seu exemplo, o terceiro, depois o quarto, o quinto e todos os demais, puseram-se a gritar sem parar todos juntos.(Quando terminarem de rezar, continuaremos a história; por ora estão ainda rezando...)Este episódio é-lhe oferecido por Podbean.com.
Wednesday Aug 14, 2024
Wednesday Aug 14, 2024
Houve uma vez um homem e uma mulher muito pobres, cujo único patrimônio erauma tosca choupana e que viviam do insignificante produto da pesca de cada dia.
Ora, aconteceu que, um dia, estando o pescador sentado à beira da água a lançar a rede, apanhou, de permeio a alguns peixinhos inúteis, um grande e todo de ouro. Ficou aí embasbacado a contemplá-lo, sem saber que pensar e, nisso, o peixe abriu a boca e falou:- Escuta, meu bom pescador, se me jogares novamente dentro da água, eu
transformarei tua pobre choupana em esplêndido palácio.O pescador respondeu, laconicamente:- Para que me serve um belo palácio se nada tenho de comer?
O peixe de ouro replicou:
- Isso também será providenciado; haverá no palácio um armário e, quando o abrires, encontrarás dentro numerosos pratos, contendo as mais finas iguarias que possas desejar.- Bem, - disse o pescador - se é assim, nada perco fazendo-te esse favor.
- Porém, - acrescentou o peixe - há uma condição a observar; não deves revelar a pessoa alguma deste mundo, seja quem for, de onde provém a tua riqueza. Se disseres uma única palavra a este respeito, tudo desaparecerá imediatamente.
O homem assentiu com a cabeça e tornou a jogar na água o peixe prodigioso; depois voltou para casa. Entretanto, no lugar da velha e tosca choupana, surgia agora um magnífico palácio. Ele arregalou os olhos, estupefato, e foi entrando. Numa sala muito luxuosa, viu a mulher sentada num divã, trajando roupas maravilhosas. Não cabendo em si de felicidade, ela disse ao marido:- Meu caro, como foi que isto aconteceu? Assim de um instante para outro? Ah, nãocalculas quanto me agrada e como estou contente!- Sim, - respondeu o marido - eu também estou contente e tudo isto me agrada muito,mas estou morrendo de fome. Arranja-me qualquer coisa para comer.- Mas não tenho nada que se coma! - respondeu a mulher - Ainda não me ambienteinesta nova casa e não sei onde achar as coisas.- É muito simples, - respondeu o marido - vejo lá naquele canto um armário; abre-o,quem sabe se não há alguma coisa dentro dele?
Com efeito, ao abrir o armário, a mulher viu, maravilhada, excelentes broas, carne assada, frutas, doces, vinhos, tudo do melhor e muito tentador à espera de ser bem aproveitado. No auge da alegria, ele exclamou:- Meu coração, que mais podes desejar?
Com a melhor disposição deste mundo, sentaram à mesa, o marido e a mulher, comeram e beberam regaladamente; uma vez satisfeitos, a mulher lembrou-se de perguntar:- Mas de onde provém, marido, toda esta riqueza?- Não mo perguntes, mulher, não posso dizê-lo. Se revelar a alguém este segredo,nossa felicidade acabará.- Bem, - disse ela - o que não devo saber não me interessa!
Mas não estava sendo sincera; por dentro remoía-se noite e dia. A curiosidade não lhe dava sossego e, tanto especulou e atormentou o marido, que este, num assomo de impaciência, acabou por confessar ser tudo aquilo obra e graça de um prodigioso peixe de ouro, que lhe caíra na rede e lhe pedira, encarecidamente, para ser lançado novamente na água. Mal acabou de falar, o magnífico palácio, com armário e tudo o mais, desapareceu e eles viram-se novamente instalados na tosca choupana.E o pescador teve que retornar ao rude trabalho. Mas a sorte favoreceu-o, fazendocom que pescasse outra vez o peixe de ouro.
- Escuta pescador, - disse-lhe o peixe - se me jogares na água, dar-te-ei novamente o belo palácio com o armário, as boas comidas e tudo o que tinhas. Deves, porém, resistir à tentação e não revelar a ninguém quem te deu essas coisas; do contrário, perderás tudo como da primeira vez.- Oh, agora serei precavido! - respondeu o pescador e jogou o peixe na água.
Em casa, tudo voltara ao esplendor de antes e a mulher estava felicíssima com sua riqueza. A curiosidade, porém, voltou a espicaçá-la sem tréguas e, passados alguns dias, não pôde conter-se mais. Tornou a indagar sem cessar como ocorrera aquilo e o que havia feito. O marido tentou por todos os meios eximir-se de responder, mas, finalmente, ficou tão amolado com a insistência dela que, num momento deimpaciência, deixou escapar da boca o segredo.Imediatamente desapareceu o palácio e tudo o mais, encontrando-se eles na velhachoupana.- Bem que o disse! - exclamou o marido - Aí tens; agora seremos obrigados a arrastarnossa existência lutando com unhas e dentes para viver!- Pois eu, - disse a mulher - antes prefiro renunciar a essa riqueza a ficar sem saber deonde vem. Não teria nunca um mínimo de sossego.
O pescador voltou a pescar. O tempo foi passando, passando, até que, um belo dia, apanhou o peixe de ouro pela terceira vez e as coisas processaram-se como das outras vezes.
- Ouve-me, pescador; - disse o peixe - vejo que é minha sina cair sempre nas tuas mãos. Portanto, desta vez leva-me para casa e corta-me em seis pedaços; darás dois à tua mulher, para que os coma; outros dois ao teu cavalo e os dois restantes enterra- os; terás muita sorte com isso.
O pescador obedeceu: Levou o peixe para casa e fez tudo conforme lhe fora ordenado. Aconteceu, então, que, dos pedaços enterrados, brotaram dois pés de lírios de ouro; do cavalo, nasceram dois potrinhos de ouro e, da mulher, nasceram dois filhos inteiramente de ouro.As crianças iam crescendo belas e viçosas e, na mesma medida, cresciam tambémvigorosos os potros e os lírios. Tudo corria muito bem até que, certo dia, os filhos
disseram:- Papai, nós queremos montar em nossos belos cavalos de ouro e correr o mundo.O pescador, muito triste, respondeu-lhes:- Se fordes embora, como agüentarei ficar sem saber como passais?
- Ora, papai! - responderam os filhos - Aqui ficam os dois lírios de ouro, graças aos quais podes saber como passamos; quando estão viçosos, significa que estamos bem e, se murcharem, que dizer que estamos doentes. Mas, se caírem, isso significa que morremos.
Depois de se despedirem dos pais, os jovens partiram nos corcéis de ouro. Tendo andado bastante, chegaram a uma hospedaria onde havia muita gente; assim que essa gente viu os dois rapazes de ouro, romperam em ruidosas gargalhadas, zombando deles. Ouvindo tais zombarias, um dos rapazes envergonhou-se e desistiu de ir mais longe; deu volta ao cavalo e regressou à casa do pai.O outro, porém, mais audacioso, continuou o caminho e foi dar a uma grande floresta.Dispondo-se a atravessá-la, alguém o preveniu, dizendo:
- É impossível atravessar essa floresta; está infestada de bandidos, que poderão causar-te grandes males. Além disso, vendo que és de ouro, assim como teu cavalo, naturalmente matarão um e outro.Mas o rapaz não se amedrontou e respondeu:- Preciso e quero atravessá-la, custe o que custar.
Então arranjou algumas peles de urso e cobriu-se inteiramente, fazendo o mesmo com o cavalo, de maneira que não se percebia a menor nesga de ouro; depois de assim disfarçado, penetrou calmamente na floresta. Tendo andado um certo trecho de caminho, ouviu um sussurro de vozes por entre as moitas, como de gente a falar entre si. De um lado diziam:- Eis um aí!Do outro lado, ouviu dizer:- Deixa-o ir! É um pele de urso, pobre e pelado como um rato de igreja, que faríamoscom ele?Assim o rapaz de ouro conseguiu atravessar, sem maiores aborrecimentos, a floresta.Certo dia, passando por um povoado, viu uma jovem tão linda que, pensou ele, nomundo inteiro era impossível encontrar melhor. Apaixonou-se instantaneamente;
então, aproximou-se dela, dizendo:- Linda jovem, amo-te de todo o coração; queres ser minha esposa?Ela também se apaixonou por ele e aceitou a proposta.- Quero sim - disse-lhe - e prometo ser uma esposa fiel e carinhosa por toda a vida.Então casaram-se e, quando estavam no melhor da festa, chegou o pai da moça que,
ao ver a filha casando-se, ficou muito surpreendido e perguntou:- Mas onde está o noivo?- É este - disseram, indicando-lhe o rapaz de ouro, ainda revestido com a pele de urso.O pai não pôde conter o furor à vista do noivo e queria matá-lo.- Nunca, nunca darei minha filha a um vagabundo, um reles pele de urso!A noiva atirou-se-lhe aos pés, suplicando desesperadamente:- Ele agora é meu marido e eu amo-o de todo o coração!
Tanto implorou e chorou que o pai se acalmou. Mas aquilo não lhe saía do pensamento, preocupando-o o tempo todo. Na manhã seguinte, levantou-se bem cedo e quis certificar-se com seus próprios olhos se o marido de sua filha era realmente um reles vagabundo.
Dirigiu-se pé-ante-pé ao quarto deles e espiou pela fechadura da porta. Quando viu deitado na cama um belo rapaz de ouro e no chão as peles de urso, voltou pelo mesmo caminho, dizendo com os seus botões:- Ainda bem que dominei a tempo minha tremenda cólera, senão teria cometido umcrime abominável.
Durante o sono, o filho de ouro teve um estranho sonho. Parecia-lhe estar caçando na floresta e que perseguia um esplêndido cervo. Pela manhã, quando acordou, disse à mulher que desejava ir caçar na floresta. Ela, receando alguma desventura, suplicou- lhe que ficasse em casa, explicando:
- Tenho pressentimento que te poderia acontecer alguma desgraça.Mas ele insistiu, não acreditando no pressentimento da mulher.- É preciso que eu vá; tenho de ir, custe o que custar.
Levantou da cama, preparou-se e foi para a floresta. Não demorou muito, viu surgir pela frente um belíssimo cervo, exatamente como vira em sonho. Apontou a espingarda e ia atirar mas, de um salto, o cervo deitou a fugir, enquanto o moço o perseguia por entre vales e sebes. A correria durou o dia inteiro, mas, ao anoitecer, o cervo desapareceu sem deixar traços.O rapaz, desconsolado, pôs-se a olhar de um lado para outro e, nisso, avistou bem emsua frente uma casinha habitada por uma bruxa. Foi até lá e bateu na porta; saiu
uma velhinha perguntando:- Que estás fazendo de noite nesta floresta?- Não viste por acaso passar um cervo por aqui? - perguntou o moço.- Ah, sim, - respondeu ela - conheço-o muito bem!Com a velha saíra também um cãozinho, que latia e investia furiosamente para ele.- Cala-te, sapo imundo, - disse o moço, exasperado - se não te mato.Então a bruxa gritou, revoltada:- Como? Pretendes matar meu cãozinho?E, instantaneamente, transformou o rapaz numa pedra. Enquanto isso, a recém-
casada esperava em vão o marido.- Certamente lhe aconteceu aquilo que tanto me amedrontava e me oprimia o coração- pensava ela aflita.Na casa paterna, o outro irmão estava contemplando os lírios de ouro quando, subitamente, viu um deles perder a haste.- Deus, Deus, meu Deus! - exclamou angustiado - Aconteceu uma grave desgraça a
meu irmão! É preciso que eu parta imediatamente, talvez ainda consiga salvá-lo.Mas o pai tentou dissuadí-lo, dizendo com tristeza:- Não partas, meu filho! Fica aqui comigo; se perco a ti também, que farei depois?- Não, meu pai, - respondeu o moço - preciso de ir ver o meu irmão.Montou no cavalo de ouro e disparou rumo à floresta, onde seu irmão jazia petrificado.A velha bruxa saiu de dentro da casinha e convidou-o, querendo apanhá-lo também narede; mas ele não se aproximou, gritando-lhe de longe.- Restitui a vida a meu irmão, se não te mato agora mesmo.Embora de má vontade, ela tocou com a ponta do dedo a pedra e logo esta sereanimou, recuperando a forma humana.Loucos de alegria por se tornarem a ver, os dois irmãos de ouro abraçaram-se e beijaram-se muito comovidos. Em seguida, cada qual em seu cavalo, saíram da floresta, dirigindo-se um para os braços da esposa e o outro para a casa do pai, que, ao vê-lo de volta, exclamou:- Eu já sabia que conseguiras salvar teu irmão; porque o lírio de ouro endireitou-se repentinamente e refloresceu com todo o viço.Depois disso, todos eles viveram alegres e felizes durante muitos e muitos anos, até o fim de suas vidas.Este episódio é-lhe oferecido por Podbean.com.
Wednesday Aug 14, 2024
Wednesday Aug 14, 2024
Houve, uma vez, um jovem compônio chamado João; seu primo queria arranjar-lhe uma mulher rica e, para conseguir o que queria, mandou João sentar-se confortavelmente ao pé do fogo, onde crepitavam alegremente as chamas. Depois foi à cozinha buscar um caneco de leite e uma pilha de fatias de pão branco; em seguida, pôs-lhe na mão um vintém brilhante, novinho em folha e lhe disse:- Escuta aqui, João; segura bem esta moeda na mão. O pão branco deves ensopá-lo no leite e fica ai sentado bem quietinho até que eu volte.- Está bom, - disse João, - farei como dizes.O casamenteiro vestiu umas calças remendadas o foi para a aldeia vizinha, á casa da filha de um camponês rico.- Gentil donzela, - disse ele, - não quereis casar com meu primo João? Tereis um marido muito esperto e sensato, que vos agradará muito.O pai da moça, que era extremamente avarento, logo perguntou:- Como está ele de finanças? Tem o que botar a ferver na panela?- Meu caro amigo, - respondeu o casamenteiro, - meu jovem primo não padece frio nos pés e não lhe falta uma boa sopa; além disso, tem belas moedas na mão e não conta com menos bens do que eu - e batia as mãos nos remendos das calças. - Se quereis dar-vos o trabalho de vir comigo agora mesmo, podereis ver confirmado o que digo.O avarento não quis perder a oportunidade e respondeu:- Pois bem, se as coisas são mesmo como dizeis, não me oponho a esse casamento.Portanto, no dia aprazado, realizaram-se as bodas e, quando a recém-casada quis ir ao campo para ver as propriedades do marido, João despiu primeiro a roupa nova e vestiu o velho blusão remendado, dizendo:- Não quero sujar meu fato novo.Em seguida dirigiram-se os dois para o campo; quando aparecia ao longe uma seara ou um vinhedo, ou então um belo campo lavrado, João apontava com o dedo e batia nos remendos do seu blusão, exclamando:- Esta placa e a outra também são minhas; olha aqui meu bem!E com isto queria dizer que a mulher não devia olhar só para os campos, mas olhar, também, para a roupa a qual, essa sim, era verdadeiramente sua.- Tu também foste ao casamento?- Naturalmente, e bem elegante estava eu. Meu toucado era de neve; veio o sol e o derretou; meu vestido era de teia-de-aranha, passei por um espinheiro e ele se rasgou; meus sapatos eram de vidro, tropecei numa pedra e eles fizeram clinc! e se espatifaram.Este episódio é-lhe oferecido por Podbean.com.
Wednesday Aug 14, 2024
Wednesday Aug 14, 2024
João servira ao seu amo durante sete anos e, um dia, disse-lhe:- Meu amo, meu tempo de contrato esgotou-se; agora quero voltar para a casa de minha mãe; dai-me o meu ordenado.O amo respondeu:- Serviste-me fiel e honestamente; tal serviço pede igual remuneração.E deu-lhe uma barra de ouro grossa, quase como a sua cabeça. João pegou o lenço do bôlso, embrulhou o pedaço de ouro, pô-lo às costas e meteu-se a caminho, rumo à casa da mãe. Ia andando, sossegadamente, pela estrada afora, quando viu um cavaleiro alegre e pimpão, que vinha trotando sobre um brioso cavalo.- Oh, - disse João em voz alta - como há de ser bom andar montado num cavalo! Fica-se comodamente sentado como numa cadeira, não se tropeça nas pedras, não se gasta o calçado e se avança sem mesmo dar por isso.O cavaleiro, que ouvira o que êle dizia, parou e gritou-lhe:- Mas, João, por que andas a pé?- Que remédio! - respondeu João - Tenho êste fardo pesado que devo levar para casa; é ouro, bem sei, mas pesa tanto que me esmaga o ombro e nem sequer posso levantar a cabeça.- Queres saber uma coisa? - disse o cavaleiro - façamos uma troca! Eu te dou o cavalo e tu me dás o teu pedaço de ouro.- Oh! de muito boa vontade, - disse João - mas vos previno que deveis fazer fôrça.O cavaleiro apeou-se bem depressa, pegou na barra de ouro e ajudou João a montar a cavalo. Meteu-lhe as rédeas na mão, recomendando-lhe:- Se quiseres que corra como o vento, basta fazer um estalinho com a língua e gritar: hop, hop!João estava felicíssimo em cima do cavalo e partiu a trote largo. Ao cabo de algum tempo teve a idéia de ir mais depressa. Deu um estalinho com a língua e gritou: hop, hop!O cavalo, obediente, partiu a galope desenfreado e, num bater de olhos, João foi pelos ares, caindo dentro de um fôsso à beira da estrada. O cavalo teria continuado no galope se um camponês, que vinha em sentido contrário, conduzindo uma vaca, não o agarrasse pelas rédeas.João apalpou os membros doloridos e pôs-se de pé. Mas ficara aborrecido e disse ao camponês:- Que belo gôsto montar a cavalo, sobretudo quando se topa com um animal como êste, que tropeça e atira a gente pelos ares, fazendo quase quebrar o pescoço! Nunca mais tornarei a montar a cavalo. Por falar nisso; a tua vaquinha, sim, me agrada. Pode-se ir atrás dela muito sossegado e além disso, tem-se leite, manteiga e queijo garantidos. Quanto não daria para ter uma vaca como essa!- Ora, - disse o camponês - se te agrada tanto, poderemos trocar a minha vaca pelo teu cavalo.João concordou todo feliz; o camponês saltou para cima do cavalo e partiu a galope. Tocando, calmamente, a vaca diante de si, João ia refletindo nas vantagens do negócio que acabava de realizar. "Contanto que eu tenha um pedaço de pão, e decerto não me há de faltar posso, quando tiver fome, comer também um pouco de manteiga e queijo; quando tiver sêde, tiro leite da minha vaca e bebo-o. Meu coraçãozinho, que podes desejar mais?"Ao chegar a uma estalagem, parou, e julgando ter agora provisões para tôda a vida, liqüidou tranqüilamen- te todo o farnel que levava para a viagem e, com os últimos vinténs que possuia, deliciou-se com um bom copo de cerveja. Em seguida, encaminhou-se rumo à aldeia de sua mãe, tocando a vaca diante de si.Ao meio-dia, o calor tornou-se sufocante e João encontrava-se em plena charneca, onde se demoraria ainda uma hora. Sentia tanto calor e sêde que até a língua se lhe pegava ao céu da bôca. "Mas tenho um remédio, - pensou - vou ordenhar a minha vaca e refrescar a garganta com o bom leite."Amarrou a vaca a um pau, e por falta de coisa melhor, quis aparar o leite com seu boné de couro; mas, por mais que puxasse e espremesse, das tetas não saiu uma só gôta de leite. Como não tinha jeito para lidar com a vaca, ela zangou-se e atirou-lhe tal coice na cabeça que o fêz rebolar a dez passos de distância, onde ficou estendido sem sentidos. Aí ficou um bom pedaço de tempo; felizmente, porém, chegou um carniceiro empurrando um carrinho com um leitãozinho dentro.- Que brincadeira sem graça! - disse êle, e ajudou João a levantar-se.João contou-lhe tudo o que havia acontecido; o carniceiro ofereceu-lhe o seu frasquinho dizendo:- Bebe um trago, que logo te reanimarás. Aquela vaca nunca mais dará leite, já está velha e sêca, boa, quando muito, para ser atrelada a uma carroça ou então para ser levada ao matadouro.- Oh diabo, - disse João puxando os cabelos desgrenhados; - quem diria uma coisa destas! Naturalmente, seria uma grande vantagem matar o animal em casa! Quanta carne teríamos! Mas não gosto de carne de vaca, não a acho saborosa. Ah! se fôsse um leitãozinho igual a êsse; então, sim, seria delicioso! Sem falar nas salsichas que daria!- Escuta, João, - disse o carniceiro; - por seres quem és e porque desejo ser-te agradável, estou disposto a trocar o meu leitão pela tua vaca.- Que Deus te recompense tanta bondade! - disse João.Entregou-lhe a vaca e levou o leitão, segurando-o pela corda com que estava amarrado no carrinho.João continuou o caminho pensando em como tudo lhe ia às mil maravilhas; apenas tinha uma contrariedade e logo se remediava. Nisso, aproximou-se um rapazinho, que levava debaixo do braço um belo pato branco, muito gordo. Cumprimentaram-se desejando um bom dia e, conversa vai conversa vem, João contou-lhe as suas aventuras, gabando-se da boa sorte, e das trocas sempre tão vantajosas. O rapazinho, então, contou que levava o pato à aldeia vizinha e que estava destinado a um banquete de batizado.- Experimente o seu pêso, - disse, levantando-o pelas asas, - é pesado, não acha? Também, já faz dois mêses que o venho engordando com o que há de melhor! Quem tiver a sorte de meter os dentes em semelhante assado, verá a banha escorrer-lhe pelos cantos da bôca.- E' verdade, - disse João levantando o pato com uma das mãos - é um bonito animal. Mas, também, o meu leitão não é mau e tem o seu valor!Entretanto, o rapaz olhava para todos os lados com certa precaução; depois, abanando a cabeça, disse:- Olha, a história do teu leitão não me parece muito limpa: acabam, justamente, de roubar um ao prefeito da aldeia onde passei agora. Tenho palpite que deve ser êsse que levas aí. Mandaram gente a procurá-lo por toda parte e seria uma coisa terrível se te apanhassem com êle; o menos que te aconteceria era ser metido numa prisão escura.O pobre João ficou assustadíssimo e exclamou:- Ah, Deus meu! Livrai-me desta desgraça! Tu que conheces a região melhor do que eu e sabes, portanto, onde esconder-te, leva o meu leitão e dá-me o teu pato.- Arrisco-me muito com isso, - disse o rapazinho, - mas, só para te livrar de apuros, vou fazer o que me pedes.Pegou, então, na corda e bem depressa levou o lei- tãozinho, desaparecendo por um atalho. O honrado João, livre dessa preocupação, continuou a caminhar rumo a casa, levando o pato debaixo do braço e ia pensando:- Calculando bem, saí ganhando na troca. Primeiro, a carne de pato é mais fina para assado e mais saborosa que a de leitão; e com tôda esta banha terei gordura por uns bons três mêses e, finalmente, com as belas penas brancas farei uma boa almofada, na qual dormirei sem que seja preciso embalar-me. Santo Deus, como minha mãe vai ficar contente com tão lindo animal!Após ter atravessado a última aldeia, antes de chegar à sua, viu um amolador parado com a sua carangue- jola; a roda girava, girava e êle acompanhava-a cantando:
- Afio tesouras e rodo ligeiro;e penduro a manta como sopra o vento...
João parou e ficou olhando o que êle estava fazendo, depois disse:- Parece que tudo vai à medida dos teus desejos, visto que trabalhas tão alegremente!- Oh, se vai! - respondeu o outro. - Qualquer ofício manual é ouro em barra. Um bom amolador é um homem que, quando mete a mão no bôlso, sempre encontra dinheiro. Mas, onde compraste êsse belo pato? Nunca vi tão bonito por aqui!- Não o comprei, ganhei-o em troca de um leitão- zinho.- E o leitão?- Ganhei-o em troca de uma vaca.- E a vaca?- Tive-a em troca de um cavalo.- E o cavalo?- Por aquêle dei um pedaço de ouro do tamanho da minha cabeça.- E o ouro?- Era o pagamento que me deu meu amo por sete anos de serviço.- Vejo que sabes te defender muito bem neste mundo; se agora chegares a ouvir tôdas as manhãs tinir dinheiro no bôlso quando enfiares as calças, tua fortuna está feita.- Sim, mas que devo fazer para isso? - perguntou João.- Deves tornar-te amolador como eu; para isso é preciso, primeiro, ter a pedra de amolar; o resto vem depois. Tenho aqui uma, na verdade está um pouco gasta, mas em troca desejo apenas que me dês o teu pato; aceitas?- Ainda mo perguntas? - respondeu João. - Se, como dizes, terei sempre dinheiro no bôlso, serei o homem mais feliz do mundo; que mais posso desejar?Entregou ao amolador o pato e recebeu em troca a pedra de amolar e mais uma outra qualquer que apanhou no chão.- Eis-te aqui mais esta bela pedra, - disse o amolador - é excelente para fazer uma bigorna e para endireitar pregos ou arranjar as ferramentas. Fica com ela e guarda-a com cuidado.João pegou nas duas pedras e partiu muito alegre, os olhos brilhando de felicidade.- Devo ter nascido com a camisa da felicidade, - pensava êle - pois tudo o que desejo se realiza!No entanto, como estava caminhando desde manhã bem cedo, sentiu-se cansado; além disso a fome começava a atormentá-lo, pois já não tinha nada que comer, tendo devorado o farnel de uma só vez a fim de festejar a troca da vaca. Por fim, andava a custo e a cada instante era obrigado a descansar; as pedras pesavam tremendamente e lá consigo pensava quanto seria agradável não ter de as carregar, agora que estava tão cansado. Arrastando-se como uma lesma, conseguiu chegar até uma fonte, contente de poder refrescar a goela e descansar um pouco estendido na erva.Não querendo estragar as pedras, colocou-as cuidadosamente à beira da fonte, bem perto dêle. Depois sentou e foi abaixar-se para encher o boné de água, mas, sem querer, empurrou um pouquinho as pedras, que rolaram para dentro da água.- João, quando as viu desaparecer dentro da água, deu um pulo de alegria, depois ajoelhou-se e agradeceu a Deus, com lágrimas nos olhos, por tê-lo atendido mais essa vez, desembaraçando-o do pesado fardo sem que êle tivesse de se censurar.- Não há ninguém neste mundo mais feliz do que eu! - exclamou.De coração aliviado, livre de qualquer pêso, saiu a correr e só parou quando chegou à choupana de sua mãe.Este episódio é-lhe oferecido por Podbean.com.
Wednesday Aug 14, 2024
Wednesday Aug 14, 2024
Houve, uma vez, um homem que vivia jogando, por isso era denominado João Jogatudo, pois jogava tudo o que tinha; chegou mesmo a jogar e perder a casa e tudo o mais que possuia.Ora, justamente na véspera do dia em que lhe iam tomar a casa, chegou Nosso Senhor, acompanhado de São Pedro, pedindo que lhes desse pouso para aquela noite. João Jogatudo disse-lhes:- Por mim podeis ficar, mas não tenho camas nem nada para comer.Então Nosso Senhor disse-lhe que bastava alojá-los; a comida ficaria por conta dêlcs c João Jogatudo ficou satisfeito.São Pedro deu-lhe trés vinténs e mandou que fflsse à padaria comprar um pouco de pão. Ele saiu para ir á pa-daria mas, ao chegar diante da casa onde estavam os outros jogadores que lhe haviam feito perder tudo, êstes chamaram-no:- Vem, Jogatudo, entra um pouco!- Pois sim! - respondeu êle - quereis fazer-me perder também êstes três vinténs!Os outros, porém, insistiram tanto que êle acabou entrando e perdeu os três vinténs. São Pedro e Nosso Senhor esperaram um tempão e, como êle demorasse a chegar, resolveram ir ao seu encontro. Assim que os viu, João Jogatudo fingiu ter perdido o dinheiro numa poça de água e remexia lá dentro como se o estivesse procurando; mas Nosso Senhor já sabia que eu tinha perdido no jôgo. Então São Pedro deu-lhe mais três vinténs; e desta vez João Jogatudo não se deixou tentar pelos outros e comprou o pão, levando-o aos hóspedes. Nosso Senhor perguntou-lhe se não tinha um pouco de vinho, êle respondeu:- Ah, Senhor, os barris estão todos vazios!Então, Nosso Senhor mandou que fôsse à adega, dizendo:- Ainda há vinho e do melhor; vai ver.João Jogatudo quedou-se um pouco em dúvida, finalmente disse:- Irei, mas sei que não há vinho algum.Foi à adega, abriu a torneira do barril e logo jorrou um vinho delicioso. Ele encheu o caneco e levou o vinho aos hóspedes, que passaram a noite na casa. No dia seguinte, muito cedo, Nosso Senhor disse a João Jogatudo que pedisse três graças pensando que pediría para ir ao céu, mas João Jogatudo pediu um baralho que o fizesse ganhar sempre, uns dados que o deixassem ganhar todasas vêzes que jogasse, e uma árvore, que produzisse tôda espécie de frutas e na qual, se alguém se atrevesse a trepar, não podia mais descer enquanto êle mesmo não o ordenasse. Nosso Senhor concedeu-lhe tudo o que pediu e foi-se embora com São Pedro.Aí João Jogatudo pôs-se a jogar mais do que nunca e não tardou em ganhar meio mundo. Então São Pedro dirigiu-se a Nosso Senhor, dizendo:- Senhor, isso não pode continuar; aquêle malandro acabará por ganhar o mundo inteiro; temos que mandar-lhe a Morte.E mandaram-lhe a Morte. Ela chegou justamente quando João Jogatudo estava no melhor de uma partida.- Vem cá fora um pouco, - disse a Morte.Mas êle respondeu-lhe:- Espera um minutinho, até acabar esta partida; enquanto isso podes trepar naquela árvore e colhêr algumas frutas para que tenhamos o que lambiscar durante a viagem.A Morte trepou na árvore e, quando quis descer, não pôde. João Jogatudo deixou-a lá em cima durante sete anos e, nesses anos todos, não morreu mais ninguém.Então São Pedro disse a Nosso Senhor:- Senhor, êsse homem não está agindo direito já faz sete anos que não morre ninguém; precisamos ir nós dois lá embaixo.Desceram os dois e foram ter com João Jogatudo. Nosso Senhor, então, ordenou-lhe que fizesse a Morte descer da árvore. Êle obedeceu e mandou a Morte descer. Ela desceu e agarrou-o pelo pescoço, estrangulando-o. Assim foram juntos para o outro mundo; João Jogatudo chegou à porta do céu e bateu.- Quem é?- E' João Jogatudo.- Não te queremos aqui; vai-te embora.Ele então foi bater à porta do purgatório.- Quem é?- E' João Jogatudo.- Já temos amolações de sobra aqui! Não queremos jogar; vai-te embora.Então, êle foi bater à porta do inferno e lá o deixaram entrar, mas não estava ninguém em casa, apenas o velho Lúcifer e alguns pobres diabos coxos; os direitos estavam muito ocupados na terra. João Jogatudo pôs-se logo a jogar. Lúcifer porém, não possuia nada além dos seus pobres diabos aleijados, e Jogatudo ganhou-os todos pois com seu baralho ganhava sempre tudo.Aí, com os diabos coxos, êle foi-se embora e chegaram todos a Hohenfurt; lá, pegaram uma vara de colhêr frutos de lúpulo e com ela começaram a forçar o céu; quando o paraíso começou a ranger, São Pedro foi ter com Nosso Senhor, dizendo:- Senhor, isto vai mal; temos que deixá-lo entrar, se não êle faz despencar o céu.Assim, deixaram-no entrar. Mas João Jogatudo começou logo a sua jogatina. Não tardou muito, desencadeou-se tamanho pandemônio e gritaria que ninguém mais conseguia ouvir o que se dizia. Então, São Pedro tornou a dizer:- Senhor, assim não vai; temos que atirá-lo para fora, se não êle revoluciona todo o paraíso.Aí, pegaram-no e atiraram-no para baixo; e sua alma partiu-se em mil pedaços, caindo cada pedaço nos antros dos jogadores, onde vive até hoje.Este episódio é-lhe oferecido por Podbean.com.